Pelos encantos de Roma

Adair Dittrich retorna ao centro da fé católica 33 anos depois

 

 

Estava, enfim, uma vez mais, em um dos locais mais santificados do mundo. Em pleno coração do Vaticano. Vagueei entre as pessoas que por ali circulavam. Uma algaravia sem fim nos mais estranhos e diferentes idiomas existentes em nosso orbe, mesclavam-se desordenadamente.

 

 

 

Se, em tempos de inércia, sossego e sedentarismo já se toma muita água, imagine-se a minha sede àquela hora, em pleno sol de verão romano, após horas de caminhada… E logo fui em busca de um bar, cantina ou lanchonete onde pudesse encontrar água gelada. Não me lembrava de um local assim naquela praça. Mas havia. Um espaço onde todas as lembranças sagradas podem ser adquiridas. Com a promessa de que tudo o que nele se adquirisse, ficaria arquivado, com seu nome. Enquanto se realizassem as visitas aos demais recintos sagrados, aqueles objetos seriam abençoados por um dos bispos, ou, quem sabe, até pelo Santo Padre.

 

 

 

E mais espaços lá para se descansar havia. Com água. Com cafeterias automáticas. Com sanitários a se perder de vista.

 

 

Em plena praça tendas e mais tendas oferecendo a mais variada gama de suvenires sagrados. O tradicional rosário. Que de pétalas de rosas, artesanalmente, são feitos. Ou, alguns, mais em conta, apenas com o suave aroma de suas pétalas. Que chineses, muçulmanos, budistas, adquiriam também.

 

 

 

Imaginei-me a enfrentar filas para ver o que eu já conhecia, olhei para a cúpula da famosa Basílica de São Pedro. Lembrei-me de minha aventura quando cheguei, lá no alto, pela íngreme e estreita escadaria, na primeira vez em que lá estive. Trinta e três anos já são decorridos desde então.

 

 

Era chegada a hora de procurar uma trattoria para almoçar. Mas nada em seu entorno me cativou. Seriam as nuas paredes com pleno sol nelas refletido a mostrar-me faces suarentas, faces cansadas?

 

 

 

Foi então que perguntei a um dos guardas do Vaticano, que pela via a meu lado circulava, onde poderia tomar um táxi. Explicou-me tão gentil, correta e minuciosamente que quando dei por mim quase dentro de um deles eu me encontrava.

 

Piazza Navona

 

Não me recordava de ter estado na Piazza Navona. E para lá pedi para o motorista me levar.

 

 

Claro que dentro dela veículos não circulam. Mas o deslumbramento já começou na via lateral, onde saltei do carro. Realmente, eu passara por ela, ao largo, nas vezes anteriores que por Roma circulei. Sem me deter em seus detalhes.

 

Palácio Pamphilj

Lembrava-me do Palácio Pamphilj, visto por alto, apenas de passagem. O Palácio Pamphilj, um pedaço do Brasil em Roma. A sede de nossa embaixada, naquele local sediada desde o ano de 1920.

 

 

Piazza Navona, que lembra os tempos barrocos. A emoldurá-la outros palácios e a Igreja de Santa Agnes.

 

 

Mas o que mais chama atenção nesta praça são as suas fontes. Encantadoras fontes que espalham o frescor, que tornam o ar mais úmido, que parece deixar o verão menos agressivo e mais suave.

 

 

Entre elas, e ao redor delas, artistas plásticos expõem suas telas, suas imagens, sua arte. Barítonos e tenores alçam suas vozes. Sobre um tapete, ao lado, um chapéu ou uma terrina à espera que apreciadores nelas depositem moedas.

 

 

Passando por entre elas ouvi alguém a cantar. Mas não era uma das tradicionais melodias italianas. Uma conhecida canção, em língua inglesa, ele cantava. Tema de algum filme, talvez. Nenhuma moeda em seu chapéu caía. Pedi que que cantasse “O Sole Mio”. O mundo aos pés dele chegou. E logo moedas foram caindo. Eram chineses, árabes, hindus, africanos… Porque quem vai para a Itália, das coisas da Itália quer ouvir e sentir.

 

 

Ao longo da praça trattorias, cantinas e restaurantes sucediam-se. Chamou-me a atenção aquele que, em um letreiro gigante, anunciava Pizzas, que eram assadas em forno a lenha. Fiquei pasma. Em pleno centro buliçoso de Roma, um forno a lenha onde se assavam pizzas. A atração que eu precisava para me sentar. E foi mais um inesquecível almoço. Defronte, as águas da Fonte dos Quatro Rios. Com música italiana dos tempos de minha Nonna Thereza e do Nonno Gobbi.

 

 

Deixei-me ali ficar por longo tempo. Porque a arte pela Piazza Navona desfila. Mágicos pincéis a eternizar passantes. Modelos c fotógrafos em busca dos melhores ângulos. Imaginei que dali sairiam imagens a cativar o mundo na compra de novos produtos, de novas roupas. Incrível a versatilidade de uma modelo e sua fotógrafa. Após poses e mais poses com um modelo, logo sumiam e retornavam com outro traje para mais fotos serem captadas.

 

 

 

Malabaristas de todos os perfis a demonstrar seus dons. Alçando fogo aos ares. Bastões e bolinhas a rolar pelo céu. Palhaços, com a indefectível bolinha vermelha no nariz, a imitar os passantes…

 

 

Horas e horas assim se passaram. Com passarinhos associando-se com os fregueses na degustação das pizzas.

 

 

 

Nas vias em torno uma infinidade de lojas onde se encontra de tudo. Vitrines esbanjando Versace, Chanel, Doce, Valentino, Gabana, Dior, Prada… Em outra viela malas e maletas. Oferecendo uma infinidade de modelos e cores com as medidas exatas, de acordo com a lei, para ser levadas como bagagem de mão nas viagens aéreas.

 

 

Ponte sobre o rio Tevere

O tempo a correr e eu devagar. Empurrando minha nova aquisição fui em busca de um táxi. Precisava retornar ao hotel. Até então todos os motoristas, homens e ou mulheres, que haviam me conduzido pelas ruas das diversas cidades da Itália por onde eu havia passado naqueles últimos dias foram pródigos em explicar fatos e detalhes de seus bairros, de suas vilas, de suas obras de arte… Ao cruzar o rio Tevere, no local exato, onde se encontravam as estátuas dos anjos, inquiri daquelas imagens à taxista. Lacônica resposta: “São anjos”. E nada mais. Estava ela mais preocupada em discutir coisas de sua vida particular e amorosa com alguém que parecia não querer entendê-la… Eram os famosos Anjos de Bernini. Que depois, muito depois, me relampeou pela cabeça.

 

Trastevere

Nem deu tempo para um descanso no hotel. Logo, logo deveríamos tomar o ônibus que nos levaria para uma inesquecível noite no Trastevere.

 

 

 

Trastevere. O outro lado do Tevere, o lendário rio que viu Roma nascer. Era dia ainda quando chegamos ao nosso destino. Ao lado de uma praça. Ah! Sempre as praças por onde quer que se ande. Porque desde tempos imemoriais todas as vilas e cidades preservaram estes vastos espaços em meio ao casario, em meio aos castelos e palácios. Para que nelas o povo se reunisse. Para que nelas o povo falasse. Para que nelas o povo cantasse e contasse. Para que nelas o povo mostrasse suas músicas, suas danças, seus poemas, suas odes. Praças desnudas. Praças sem o verde. Sem jardins. Mas praças. Onde há árvores e jardins já é diferente. Já são parques…

 

 

 

E naquela praça, em dia claro ainda, as melodias ecoavam. Estava eu ali com os amigos paulistas que me adotaram. E então fomos em busca de um restaurante. Para o nosso último jantar em Roma. Para o nosso último jantar na Itália. Mariane, a jovem coleguinha médica, tinha uma indicação especial de um local cheio de música, alegria e as melhores massas de Roma. Mas estávamos em pleno agosto. Na famosa Ferragosto. Nas férias de agosto. Estava fechado para as férias de verão.

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