Leia nova coluna de Adair Dittrich
A cidade de Chamonix com tantas altas montanhas em seu entorno, principalmente “Les Aiguilles du Midi” era um local encantado que, desde os meus tempos no Sagrado Colégio de Canoinhas, em minha memória guardados em um canto se encontravam.
Nova viagem de sonhos em um trem que em Genebra bem cedo tomamos. Partíamos de uma altitude em torno dos trezentos metros acima do nível do mar. Não percorríamos uma íngreme subida. Lentamente, contornando montanhas e às vezes fazendo um caminho em caracol nosso comboio chegou a mais de mil metros de altura. E surge aos nossos olhos Chamonix.
Em todo o seu estilo de cidade que congrega pessoas do mundo todo. Pessoas como nós que tinham o sonho de subir aos mais altos picos gelados da Europa. Não escalá-los! Apenas chegar aos cumes para sentir o impacto da beleza branca nas grandes altitudes.
Para esta aventura não portávamos os equipamentos como os que as nossas Irmãs Franciscanas em Gaissau haviam providenciado quando de nossa subida ao Monte Sänctis. Mas foi fácil consegui-los. Lá tudo se aluga. Então partimos para a nossa aventura gelada carregando grossos capotes e meias, gorros e luvas, além das famosas botas para se andar na neve. Acrescidos ainda de óculos escuros próprios para que o reflexo do sol na gélida brancura sem fim não prejudicasse os nossos olhos.
Enquanto aguardávamos o horário que nos coube para o trenzinho das montanhas tomar, pela cidade ficamos vagueando e alguns pontos interessantes ainda pudemos observar.
Lembro-me de uma estátua que consta ser do primeiro alpinista da história com um guia a seu lado com o dedo indicador estendido apontando para os cumes do Monte Branco.
Claro que não podíamos deixar de lado as lojas de suvenires, de admirar as que exibiam exuberantes trajes de montanhismo e fantásticos esquis. Além das finas butiques com sofisticados trajes de inverno.
Ainda pudemos apreciar, mesmo que ligeiramente, um museu de cristais e outro de objetos de alpinismo.
Mas era hora de tomarmos o nosso teleférico para as “Aiguilles du Midi”. Maravilhosa escalada dentro de um trenzinho suspenso que nos permitia vislumbrar os brancos picos delineados contra um azul vibrante. Sentia-se, mesmo em ambiente aquecido, a diminuição da temperatura. E, de repente, já estávamos perto dos três mil e oitocentos metros. Logo depois tomamos um elevador que nos deixou uns oitenta metros mais acima. Uma grande caverna aquecida foi o local de colocarmos as grossas indumentárias. Só sob sua proteção possível seria nos aventurarmos do lado de fora, em uma branca planura gelada deitada entre as escarpas das agulhas do meio dia.
Enfrentamos temperaturas muito, mas muito abaixo de zero envoltas pelo ar rarefeito da montanha.
A visão de uma brancura ilimitada fez meu espírito perambular léguas e léguas em estado de êxtase total, em pura meditação quase transcendental. De onde somente retornei quando ouvi alguém, de longa distância, parecia-me, pelo meu nome chamar.
Enregelada eu estava quando retornei ao refúgio no interior da grande montanha. Se de meu encantamento arrancada eu não tivesse sido pela angustiosa voz de minha amiga Jucy talvez eu lá tivesse sido encontrada algum tempo depois em estado de hipotermia, tal o fascínio que a visão dos brancos e gélidos cumes me causou.
E nesta hora o que o meu organismo mais pedia era o aconchegante calor do chamejante fogo a crepitar na grande lareira que o restaurante das alturas ostentava. Era a hora de um fumegante chocolate com queijo quente. Era a hora de uma reconfortante taça de um rutilante bordô das costas do Ródano.
O retorno a Chamonix pelo teleférico mostrava-nos o empolgante panorama visto de todos os ângulos. Mas jamais mostrará aquela magia que eu senti quando no cume coberto de neve pisei. Quando, no cume coberto de neve eu andei. Quando, no cume coberto de neve estática eu fiquei e um grande mergulho eu pude dar na grandeza do universo.
Desembarcamos do trenzinho e encontramos Chamonix em um bulício só. Todas as cores do mundo pelas ruas a desfilar. Foi bom termos percorrido a cidade antes de subirmos aos cumes. Porque eu ainda me encontrava em outras galáxias e nada mais tinha graça depois da minha viagem transcendental a um lindo mundo. Imagens das quais não me lembro. Mas tenho ainda a sensação de que era um mundo muito lindo.

Os picos do Monte Branco dentro de mim permaneceram até a hora em que, dentro do trem, no retorno, eu dormi.
Tínhamos algumas horas na gare de Genebra antes de tomarmos o comboio noturno que na manhã seguinte nos deixaria em Paris.
Embora os relógios nos mostrassem que já eram decorridas mais de oito horas depois do meio dia, a luminosidade da tarde ainda se fazia intensa. E um giro no entorno da gare fomos fazer. Despedida do histórico Lago de Genebra. Despedida das múltiplas emoções sentidas ao rodar por uma tão intensa cultura. Cultura que se sente impregnada nas paredes dos muros e construções por onde se passa.
Havíamos nos alimentado frugalmente por todo aquele dia. Na estação ferroviária um diferente restaurante nos surpreende. Um restaurante ao estilo inglês. Pedimos os pratos e as bebidas no balcão. E tínhamos a opção de sentarmo-nos nas banquetas a sua frente ou levar nosso pedido a uma mesa. O balcão era uma ilha central. E ali ficamos a conversar com outras tantas pessoas que, como nós, de Chamonix retornavam. Que, como nós, para Paris seguiriam.