(E as flores para todas as minhas Mães)
Existem dias especiais em que vou passear na aldeia onde nasci, a aldeia de minha infância, a minha aldeia debruçada sobre a colina que envolve o nosso fecundo vale.
Um desses dias é o dia de levar flores para as nossas mães que estão lá, bem no alto desta encantada colina escolhida por estar mais perto do céu.
É lá que eu encontro e sinto o forte e majestoso campo eletro-magnético, o campo energético de todas elas que no meu mundo, para mim, foram as minhas mães.
Flores que levo para quem a minha vida só queria que de flores fossem.
E este Campo Santo, como minha Nonna Thereza o chamava, o local onde repousará a matéria do que somos e onde dorme a dos que já por aqui peregrinaram, está lá naquela colina encantada.
E aquele Campo Santo que se debruça naquele pequeno espaço acima de tudo traz imagens tão concretas fixadas à memória, imagens que não se perderam nos tempos porque foi um tempo feliz e diferente em nossas vidas.
Mesmo com toda a tristeza que a envolvia jamais a minha Nonna deixou de, em cada domingo, subir aquele morro para levar flores a seu filho e sua mãe que lá já se encontravam muito tempo antes de eu ter nascido.
Meu Nonno construiu uma cruz de cimento, que ali ainda hoje se encontra, altaneira, sobre o monte. Uma cruz diferente. Única para mim. Semelhante a um tronco de árvore tinha em torno, como se galhos dela emergentes, pequenos arames onde se colocavam brancas rosas feitas de papel de seda.
E minha mãe depois continuou com esta mesma caminhada, com este mesmo cerimonial para aquela montanha encantada onde então só a matéria de meus Nonnos também já se encontrava.
E a cada vez que lá retorno não posso furtar-me ao encantamento que aquela colina me traz. É um horizonte poético e total que se estende pelo infinito em todas as direções. É apenas céu, uma circunferência azul esverdeada a perder-se nos confins.
Você pode lá chegar num amanhecer enevoado, com um horizonte de neblina recoberto e aguardar o momento único em que as cortinas vão se abrindo e o cenário vai surgindo aos poucos, devagar, misterioso e mágico, inebriando a alma.
Primeiro as árvores dos bosques vizinhos, já abaixo, nas encostas. Depois, ao longe, o vale, os rios, as pontes, os campos, às vezes uns trechos plenos de água imitando lagos. E bem além, muito além, nos horizontes, verde e azul se fundindo num todo em uma paisagem de estarrecer olhos e o espírito.
Mas você pode chegar também para esperar o amanhecer, para se impressionar com as tinturas amarelo-avermelhadas que surgem aos poucos tingindo um céu ainda escuro das cores da noite.
Ou aguardar o crepúsculo de todos os dias e sentir lá em seu âmago a metamorfose das horas, ver a claridade dar vazão aos seus arroubos e encostar-se aos poucos nas noturnas trevas.
Um lugar inebriante para se deslumbrar com a primeira lua cheia de inverno que surge do nada, que nasce no instante único em que o sol se deita do outro lado.
Onde as palmeiras se debruçam na dança dos ventos que fazem sonar em seus ramos melodias trazidas dos ontens milenares.
Nas palmeiras onde, no tempo certo, quando ainda é primavera e o verão vem se anunciando, também canta o sabiá.
Um lugar onde o eclipse da lua é mais eclipse. Aonde os sons chegam mais limpos. Onde a atmosfera conspira para o encontro das ninfas e dos elfos, dos gnomos e das fadas, dos amores e dos deuses.
Um lugar que deve se mostrar aos amigos e aos amantes em qualquer dia, em qualquer hora em qualquer tempo.
É o nosso mirante da colina, o magnífico Belvedere que faz entrar em êxtase até o mais taciturno dos mortais.
O local escolhido para o nosso repouso, para nós, amantes de nossa pequena aldeia, ali, bem ali a um passo do paraíso.