Andanças pela Big Apple (III)

Adair Dittrich segue viagem pela capital do mundo                                                                                

 

Chegamos no Village Vanguard com tempo suficiente para que pudéssemos nos instalar, comodamente, na mesa que fora, com muita antecedência, reservada por Walt Penny para nós.

 

 

Alguns músicos dedilhavam acordes jazzísticos em seus contrabaixos, de corda e de sopro, acompanhando solos que arrepiavam o teclado de um piano. Algumas notas surgiam de um saxofone. Outras de um pistão. Tudo na cadência de um som sincopado que o percussionista, suave e habilmente, imprimia com as baquetas em seus tímbales, caixas, repiques e madeiras.

 

 

Não havia algazarra. As pessoas iam chegando, até em conversas animadas, mas não em tom muito alto. Procuravam seus lugares para onde um pressuroso garçom as conduzia, já anotando os pedidos para o consequente consumo. Necessário era que tudo fosse servido antes que a principal atração da noite se apresentasse.

 

 

Casa lotada. Fecham-se as portas. Correm os garçons, apressadamente, a fim de servir todas as mesas com os múltiplos coquetéis e variados drinques, acompanhados de uma miríade de petiscos, dentre os quais, amendoins, mini biscoitos salgados e mini canapés bem saborosos.

 

 

Porque depois que o tão aguardado astro desse início ao seu recital, correrias, serviços de bar e congêneres não seriam mais permitidos. O que se passaria então a ouvir seria apenas algum suave tilintar de taças ou copos…

 

 

Enquanto João Gilberto soltava sua voz e deslizava seus dedos sobre as cordas de seu violão, eu tinha a impressão de somente ouvir a respiração das pessoas. Mas, era o instante apenas de ser solada a última nota de uma canção para que o público ressuscitasse em voz e aplausos.

 

 

A plateia era composta por muitos brasileiros, sim! Alguns, lá residentes, e outros tantos, turistas, como nós. A grande maioria, no entanto, era de americanos, além de pessoas de muitos outros países. João Gilberto fazia sucesso além-mar.

 

 

Após o que seria a última nota de sua última canção e o último dedilhar na última corda de seu violão, curva-se ele, ligeiramente, agradece os aplausos e sai. Mas, em pé a multidão continua a aplaudir e a pedir aquela choradinha, aquele algo mais. João Gilberto retorna. Mais um toque no violão. Solta mais uma das melodias de seu quase infindável repertório.

 

 

E então nos deixa. Definitivamente. De fininho. Sem autógrafos. Sem um papo amigo. Some pelo fundo do palco em direção ao seu camarim. Com os aplausos, apenas, em seu encalço.

 

 

Broadway

Retornamos a pé ao hotel. Percorrendo a mais longa e mais famosa avenida que cruza a ilha de Manhattan. A Broadway. Saímos de Village Vanguard até a alcançarmos e por ela andamos na noite de Nova Iorque. Desafinadamente, cantarolando o “Desafinado” música que havíamos acabado de ouvir.

 

 

Chegar ao famoso encontro da Quinta Avenida com a Rua 42. Um cenário multiplicado em cores nas revistas do mundo. Um canto cheio de cores. Profusão de neons. Em uma mistura de nuances. Matizes de luzes a despencar em cascata do alto do mais alto dos edifícios da famosa esquina. E outras mais em incessante piscar. Anunciando os produtos e os serviços, os filmes e as peças teatrais daqueles anos dourados.

 

 

Entre tantos restaurantes em que estivemos na grande cidade há um que, pelo seu nome e pela decoração de seu interior ficou-me na memória. Um local que me catapultou para dentro dos filmes do velho oeste americano e ao lado de seus lendários personagens. Era o “The Cattleman”. Com fotos de Jesse James e Doc Holliday, entre outros mais. Onde apreciamos um suculento filé grelhado no fogo.

 

 

Não poderia deixar os Estados Unidos sem trazer o que seria a última palavra em matéria de televisor. Aqui em nossa região nem repetidora dos canais de Curitiba ainda havia. Mas, eu já sabia das gigantescas antenas, que, milimetricamente apontadas, com auxílio de uma bússola, captariam o sinal das emissoras de televisão da capital paranaense. Fui atrás de uma, não muito grande, claro, a fim de que coubesse no bolso e na bolsa (de viagem), recomendada como a melhor por meus amigos Ann e Walt. Lá voltei eu para o hotel, feliz por ter adquirido uma Zenith, em preto e branco. Lá já começavam algumas transmissões coloridas. Aqui, ainda não. Já a experimentei na mesma noite no meu quarto do hotel.

 

 

E outra coisa importante que não poderia deixar de trazer. Em Miami eu já adquirira uma pequena câmera Kodak. Daquelas que era só abrir e embutir o filme. Sem o problema de se perder tempo em prender o celuloide no local apropriado. E depois rebobinar. Tudo automático e fácil. E comprava os filmes em Kodacrome. Todos diapositivos. E para isto eu precisaria de um projetor. Claro, a Kodak produzia os famosos carrosséis. Mais de cem slides lá poderiam ser armazenados. E assim a minha bagagem avoluma-se sobremaneira.

 

 

 

Para transportar tudo para o hotel, só tomando um táxi. O motorista que me levou era um simpático senhor, filho de italianos. Nesse tempo meu vocabulário na língua de meus Nonnos era um nada. E o dele, também. Entendemo-nos. Em inglês. Indicou-me alguns locais, para além da ilha, onde eu encontraria produtos bem mais em conta para comprar. Estava atrás da mais sagrada das encomendas da sobrinhada lá de casa, as famosas calças Lee, as originais, no legítimo estilo faroeste. Tomei então o Metrô e me dirigi ao local por ele indicado. Cada calça pesava em torno de um quilo. Verdade! Grossas. Trajando-se esta calça, poder-se-ia levar um tombo de moto; daqueles de se ficar arrastando a perna nas pedras britadas da rua. Ela ficaria ralada; o joelho, não.

 

 

Para as meninas da família encontrei as mesmas Lee, mas em veludo cotelê. Em tons pastel. E para completar um boné de mesmo tecido e cor. Elas jamais deixam de mencionar estas lembranças que eu lhes trouxe da terra de Tio Sam.

 

 

Chegou o dia de deixarmos Nova Iorque. O próximo destino seria Montreal e a grande Exposição Mundial, naquele ano lá sediada, a que ficou conhecida como Expo/67.

 

 

Embalamos nossos pertences em grandes caixas e os acomodamos no guarda-volumes do hotel. Levamos nessa viagem pouca bagagem. Fomos em busca de uma locadora para conseguirmos um carro. Despedimo-nos de Anne e Walt no aeroporto, onde eles tomariam um avião com destino a Charleston. E caímos nós na estrada, pela rota número 9, rumo norte pelo estado de Nova Iorque afora.

 

 

 

Era tarde já, quando deixamos a grande cidade. Pernoitamos na região de Newburg, em um local de nome Poughkeepsie, no “Red Bull Motor Inn”. Era uma construção que misturava o estilo virginiano em sua arquitetura. Tijolos à vista, muitas colunas brancas, como branco também era o avarandado que corria em torno da base dos telhados.

 

 

 

E uma piscina ainda de águas tépidas, onde, na manhã seguinte eu me deleitei, antes de partirmos rumo a Montreal.

Andanças pela Big Apple (III)

Adair Dittrich segue viagem pela capital do mundo                                                                                

 

Chegamos no Village Vanguard com tempo suficiente para que pudéssemos nos instalar, comodamente, na mesa que fora, com muita antecedência, reservada por Walt Penny para nós.

 

 

Alguns músicos dedilhavam acordes jazzísticos em seus contrabaixos, de corda e de sopro, acompanhando solos que arrepiavam o teclado de um piano. Algumas notas surgiam de um saxofone. Outras de um pistão. Tudo na cadência de um som sincopado que o percussionista, suave e habilmente, imprimia com as baquetas em seus tímbales, caixas, repiques e madeiras.

 

 

Não havia algazarra. As pessoas iam chegando, até em conversas animadas, mas não em tom muito alto. Procuravam seus lugares para onde um pressuroso garçom as conduzia, já anotando os pedidos para o consequente consumo. Necessário era que tudo fosse servido antes que a principal atração da noite se apresentasse.

 

 

Casa lotada. Fecham-se as portas. Correm os garçons, apressadamente, a fim de servir todas as mesas com os múltiplos coquetéis e variados drinques, acompanhados de uma miríade de petiscos, dentre os quais, amendoins, mini biscoitos salgados e mini canapés bem saborosos.

 

 

Porque depois que o tão aguardado astro desse início ao seu recital, correrias, serviços de bar e congêneres não seriam mais permitidos. O que se passaria então a ouvir seria apenas algum suave tilintar de taças ou copos…

 

 

Enquanto João Gilberto soltava sua voz e deslizava seus dedos sobre as cordas de seu violão, eu tinha a impressão de somente ouvir a respiração das pessoas. Mas, era o instante apenas de ser solada a última nota de uma canção para que o público ressuscitasse em voz e aplausos.

 

 

A plateia era composta por muitos brasileiros, sim! Alguns, lá residentes, e outros tantos, turistas, como nós. A grande maioria, no entanto, era de americanos, além de pessoas de muitos outros países. João Gilberto fazia sucesso além-mar.

 

 

Após o que seria a última nota de sua última canção e o último dedilhar na última corda de seu violão, curva-se ele, ligeiramente, agradece os aplausos e sai. Mas, em pé a multidão continua a aplaudir e a pedir aquela choradinha, aquele algo mais. João Gilberto retorna. Mais um toque no violão. Solta mais uma das melodias de seu quase infindável repertório.

 

 

E então nos deixa. Definitivamente. De fininho. Sem autógrafos. Sem um papo amigo. Some pelo fundo do palco em direção ao seu camarim. Com os aplausos, apenas, em seu encalço.

 

 

Broadway

Retornamos a pé ao hotel. Percorrendo a mais longa e mais famosa avenida que cruza a ilha de Manhattan. A Broadway. Saímos de Village Vanguard até a alcançarmos e por ela andamos na noite de Nova Iorque. Desafinadamente, cantarolando o “Desafinado” música que havíamos acabado de ouvir.

 

 

Chegar ao famoso encontro da Quinta Avenida com a Rua 42. Um cenário multiplicado em cores nas revistas do mundo. Um canto cheio de cores. Profusão de neons. Em uma mistura de nuances. Matizes de luzes a despencar em cascata do alto do mais alto dos edifícios da famosa esquina. E outras mais em incessante piscar. Anunciando os produtos e os serviços, os filmes e as peças teatrais daqueles anos dourados.

 

 

Entre tantos restaurantes em que estivemos na grande cidade há um que, pelo seu nome e pela decoração de seu interior ficou-me na memória. Um local que me catapultou para dentro dos filmes do velho oeste americano e ao lado de seus lendários personagens. Era o “The Cattleman”. Com fotos de Jesse James e Doc Holliday, entre outros mais. Onde apreciamos um suculento filé grelhado no fogo.

 

 

Não poderia deixar os Estados Unidos sem trazer o que seria a última palavra em matéria de televisor. Aqui em nossa região nem repetidora dos canais de Curitiba ainda havia. Mas, eu já sabia das gigantescas antenas, que, milimetricamente apontadas, com auxílio de uma bússola, captariam o sinal das emissoras de televisão da capital paranaense. Fui atrás de uma, não muito grande, claro, a fim de que coubesse no bolso e na bolsa (de viagem), recomendada como a melhor por meus amigos Ann e Walt. Lá voltei eu para o hotel, feliz por ter adquirido uma Zenith, em preto e branco. Lá já começavam algumas transmissões coloridas. Aqui, ainda não. Já a experimentei na mesma noite no meu quarto do hotel.

 

 

E outra coisa importante que não poderia deixar de trazer. Em Miami eu já adquirira uma pequena câmera Kodak. Daquelas que era só abrir e embutir o filme. Sem o problema de se perder tempo em prender o celuloide no local apropriado. E depois rebobinar. Tudo automático e fácil. E comprava os filmes em Kodacrome. Todos diapositivos. E para isto eu precisaria de um projetor. Claro, a Kodak produzia os famosos carrosséis. Mais de cem slides lá poderiam ser armazenados. E assim a minha bagagem avoluma-se sobremaneira.

 

 

 

Para transportar tudo para o hotel, só tomando um táxi. O motorista que me levou era um simpático senhor, filho de italianos. Nesse tempo meu vocabulário na língua de meus Nonnos era um nada. E o dele, também. Entendemo-nos. Em inglês. Indicou-me alguns locais, para além da ilha, onde eu encontraria produtos bem mais em conta para comprar. Estava atrás da mais sagrada das encomendas da sobrinhada lá de casa, as famosas calças Lee, as originais, no legítimo estilo faroeste. Tomei então o Metrô e me dirigi ao local por ele indicado. Cada calça pesava em torno de um quilo. Verdade! Grossas. Trajando-se esta calça, poder-se-ia levar um tombo de moto; daqueles de se ficar arrastando a perna nas pedras britadas da rua. Ela ficaria ralada; o joelho, não.

 

 

Para as meninas da família encontrei as mesmas Lee, mas em veludo cotelê. Em tons pastel. E para completar um boné de mesmo tecido e cor. Elas jamais deixam de mencionar estas lembranças que eu lhes trouxe da terra de Tio Sam.

 

 

Chegou o dia de deixarmos Nova Iorque. O próximo destino seria Montreal e a grande Exposição Mundial, naquele ano lá sediada, a que ficou conhecida como Expo/67.

 

 

Embalamos nossos pertences em grandes caixas e os acomodamos no guarda-volumes do hotel. Levamos nessa viagem pouca bagagem. Fomos em busca de uma locadora para conseguirmos um carro. Despedimo-nos de Anne e Walt no aeroporto, onde eles tomariam um avião com destino a Charleston. E caímos nós na estrada, pela rota número 9, rumo norte pelo estado de Nova Iorque afora.

 

 

 

Era tarde já, quando deixamos a grande cidade. Pernoitamos na região de Newburg, em um local de nome Poughkeepsie, no “Red Bull Motor Inn”. Era uma construção que misturava o estilo virginiano em sua arquitetura. Tijolos à vista, muitas colunas brancas, como branco também era o avarandado que corria em torno da base dos telhados.

 

 

 

E uma piscina ainda de águas tépidas, onde, na manhã seguinte eu me deleitei, antes de partirmos rumo a Montreal.

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