Ex-prefeito vai responder a processo por ter permutado terras com Lavrasul

Empresa “doou” ao Município área de 92 mil m² que foi cedida pelo Município há mais de 40 anos em troca de área de 400 mil m² na qual em parte pretendia construir um conjunto habitacional

 

A Justiça da Comarca de Canoinhas acatou denúncia do Ministério Público envolvendo o ex-prefeito Leoberto Weinert (PMDB) e os empresários Saul Chuny Zugmann e Isac Chami Zugmann, da Compensados e Laminados Lavrasul, acusados de improbidade administrativa ao permutar terras pertencentes ao Município em 2012.

 

Naquele ano, quando a Lavrasul reduziu consideravelmente suas atividades em Canoinhas, a empresa propôs devolver ao Município uma área de 92 mil metros quadrados no Parado em troca de outra área de 400 mil metros quadrados no bairro Industrial 1 como se as terras pertencessem de fato à empresa. Lei municipal ratificou a proposta por unanimidade, endossada por Weinert.

 

Ocorre que quando criado o Bairro Industrial número 1, na década de 1970, a área só poderia ser destinada para instalação de indústrias. Do contrário teria de ser devolvida ao Município. Contrariando a lei, a Lavrasul construiu um conjunto habitacional no local cujas casas foram cedidas a seus funcionários.

 

Em mais uma prova de desrespeito à lei, os vereadores de Canoinhas aprovaram a permuta no final de 2012, sabendo que a área de 400 mil m² que seria entregue à Lavrasul seria usada, em parte, para a construção de um conjunto habitacional a ser comercializado dentro do programa Minha Casa, Minha Vida, do Governo Federal. Em troca, o Município receberia a área de 92 mil m² na rua Henrique Sorg, onde também foram construídas casas para os funcionários da Lavrasul. Com a demissão desses funcionários, poucos deixaram as casas. A ideia da Lavrasul era de que o Município regularizasse a área a partir do momento em que as terras fossem devolvidas para o patrimônio público. “Veja-se, portanto, que não faz o menor sentido pretender ‘doar’ ao Município – disfarçando seu intento em um aparente gesto de elevada nobreza – um bem que, por ter recebido destinação diversa – habitacional, ao invés de industrial – já deveria retornar legalmente ao patrimônio municipal, por expresso texto de lei”, anotou a promotora Raquel Rodrigues de Medeiros em sua denúncia.

 

APP

A denúncia frisa, ainda, a condição precária das casas construídas na área industrial, em área de preservação permanente (APP). “(a empresa) deixou que uma aglomeração urbana desordenada se instalasse, ao arrepio da lei do parcelamento do solo, que visa a urbanização planejada como programa para o crescimento da cidade, e o que é ainda pior, em terreno que possui área de preservação permanente”.

 

Cita, ainda, casos de vendas e repasses de lotes irregularmente por parte dos beneficiados com as casas. “A empresa entendia não ter qualquer responsabilidade por esta situação”, conclui.

 

Diante do problema, acredita a promotora, a Lavrasul procurou Weinert para encontrar uma solução. “Passou-se por ‘caridosa’, mas, a bem da verdade, unicamente pretendeu beneficiar-se às custas do Município”, diz Raquel.

 

A promotora ressalta que a permuta levará o Município a gastar “elevados valores” para regularizar o terreno e, ainda, perderá uma grande área que poderia ser cedida a novas empresas.

 

ACUSAÇÃO

Para a promotoria, Weinert nada fez para que o Município não fosse prejudicado. “Tão somente elaborou o projeto de lei, às pressas, para auxiliar no enriquecimento indevido da empresa, burlando escancaradamente os princípios da administração pública.” A promotora chega a citar o ex-prefeito como desonesto ao atender a interesses particulares. Lembra que Weinert sequer exigiu que a empresa regularizasse o loteamento clandestino que se formou no terreno antes doado pelo Município. “Muito ao contrário, além de desonerar a empresa desta responsabilidade, ainda a desobrigou de prestar contas ao Município das destinações dadas aos outros imóveis que recebera”, anotou.

 

Ainda de acordo com a acusação, Saul e Isac enriqueceram ilicitamente com a lei.

 

A Promotoria pede a anulação da lei que doou a área para a Lavrasul e a destinação desse terreno para fins industriais. Aponta, ainda, que há inconsistências na lei aprovada pelos vereadores. “A lei não especificou em qual imóvel seria destinada a área para construção de moradias populares e nem mesmo especificou se as partes realizariam as construções solidariamente”.

 

“Assim, é muito claro que o acordo foi extremamente prejudicial aos cofres públicos e beneficiou exclusivamente a empresa, tendo ela total consciência de que agia dolosamente perante a administração pública”, frisa a promotora.

 

Ela pede que a empresa seja indiciada por improbidade administrativa como terceira que se relacionou com a administração pública visando enriquecer ilicitamente.

 

Antes do julgamento da ação, a promotoria pede a indisponibilidade dos imóveis permutados.

 

CONTRAPONTO

Procurado pela reportagem, Weinert disse que não tem conhecimento do processo e que, assim que intimado, vai apresentar defesa.

 

Informalmente, ele lembrou que a empresa continua operando em Canoinhas e daí se justifica a permuta que incluiu, além da área no Parado a abertura de uma rua no meio do terreno da empresa no Industrial 1. Essa rua ligaria a Álvaro Soares Machado a avenida Ivo d’Aquino, formando um corredor que ajudaria no fluxo trânsito. “Todas as minhas decisões se basearam em pareceres jurídicos”, frisou.

 

A assessoria jurídica da Lavrasul apresentou ontem a defesa prévia à Justiça. De acordo com a advogada da empresa, Alice Fernandes Aparecio de Domenico, não se trata de uma barganha. O que ocorreu, segundo ela, é que a “ação está calcada em controvérsias e colocações malfeitas por quem fez a denúncia ao Ministério Público.” Ela explica que a situação na vila criada pela empresa é que levou à conversa com o prefeito à época no sentido de resolver a situação, doando os 92 mil m² para o Município para que ele regularizasse a situação das famílias por meio do programa Lar Legal, o que de fato está ocorrendo. Em troca, a empresa pediu somente a retirada da restrição a atividades industriais do terreno onde hoje está sediada a empresa, no Industrial 1. Dessa forma, a empresa pretendia construir um conjunto habitacional em 25 mil m² do total de 400 mil m² hoje ocupados pela empresa. A área de 92 mil m², afirma a advogada, não tinha sido toda doada pelo Município. Parte tinha sido comprada pela Lavrasul.

 

A advogada frisa, ainda, que a Lavrasul segue operando normalmente e que emprega hoje cerca de 200 pessoas.

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