Na região de Canoinhas, nove pessoas se suicidaram somente neste ano

Cíntia Sampaio, 19 anos, vive na corda bamba. Desde os 15 sofrendo de depressão, ela luta contra a doença pensando que cada dia sem uma tentativa de suicídio é uma vitória. Somente neste ano, Canoinhas, Major Vieira, Três Barras e Bela Vista do Toldo registraram nove suicídios

 

Um ponto e vírgula tatuado no pulso esquerdo de Cíntia Sampaio, 19 anos, simboliza sua luta contra uma doença que aparece silenciosa, quase sempre é tratada como bobagem, nem sempre tem motivo claro, mas que, ao tomar conta, torna a recuperação cada vez mais difícil. Cíntia sofre de depressão. “Essa doença é um ponto e vírgula na minha vida. Ainda conseguirei seguir em frente”, afirma timidamente, como quem sabe que nem só com palavras positivas se combate a depressão. Tanto que toma remédios antidepressivos além de consultar regularmente com uma psicóloga. “Agradeço por quem está do meu lado, mas não teria me salvado sem os remédios”, garante.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Tatuagem simboliza a luta de Cíntia contra a depressão/Edinei Wassoaski/JMais

Cíntia mora com os avós desde criança. A mãe vive com seu padrasto e com o pai ela não tem relação nenhuma. Aos 15 uma briga a separou de seu namorado, à época, com 18 anos. Foi nesse intervalo que teve a pior crise. Sentia uma tristeza profunda, só pensava em dormir, desenvolveu síndrome do pânico e chegou aos 29 quilos porque se recusava a comer. Por diversas vezes Cíntia tentou se matar. “Eu vivia me cortando, queria que a dor física fosse maior que a dor emocional”, explica. Certa vez misturou remédios e dormiu por horas. Acordou e desmaiou ao tentar sair da cama. Foi parar no hospital. A família começou a levar o caso a sério quando ouviu do médico que não havia mais o que fazer, que a falta de alimentação a levaria à morte. “Todo mundo era feliz, menos eu”, pensava Cíntia para justificar a tristeza profunda.

 

Aquela bronca do chefe, a palavra enviesada, o plano que não dá certo, enfim, coisas que deixam qualquer um desapontado, para Cíntia, a dimensão é muito maior. “Tento lidar com essas coisas da melhor maneira possível, mas não é fácil”.

 

Mesmo com a recuperação depois dos antidepressivos e a volta do namoro, Cíntia não se considera curada. “Penso que cada dia é uma vitória”, diz. Ela reatou o namoro dos 15 anos, faz tratamento médico contínuo, recuperou o peso e começou a trabalhar. O fantasma da depressão, no entanto, a persegue. “Se vejo pessoas brigando, por exemplo, tenho ataque de pânico, preciso me trancar em algum lugar e esperar passar”, conta.

 

DEPRESSÃO E SUICÍDIO

Doença que afeta 300 milhões de pessoas no mundo todo segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) e que tem como ponto alto a falta de vontade de viver, a depressão é um convite para pensamentos suicidas. Daí a necessidade de não ignorar o que diz a pessoa deprimida. “Pra gente pode parecer uma questão pequena, mas para a pessoa tem uma dimensão maior”, afirma a psicóloga que atende pelo serviço público de saúde de Canoinhas, Aiessa Tavares. É o caso dos adolescentes, que passaram a chamar atenção depois do sucesso da série da Netflix, 13 ReasonsWhy e do jogo da Baleia Azul, espécie de gincana perversa feita pelas redes sociais que tinha como atividade final o suicídio. A série e o jogo aumentaram em 500% os atendimentos do Centro de Valorização à Vida (CVV) e chamou a atenção para uma estatística alarmante: no mundo todo, o suicídio é a segunda causa de morte entre jovens de 15 a 29 anos, atrás de acidente de trânsito.

 

E os casos de suicídio têm aumentado. Segundo a OMS, entre 2002 e 2012 o número aumentou 40% no Brasil, país onde 32 pessoas se suicidam por dia, ou seja, uma a cada 45 minutos. Trata-se do oitavo país com maior número de suicídios.

 

Santa Catarina é segundo estado em número de suicídios a cada 100 mil habitantes, segundo o Mapa da Violência. Com 8,6 registros em 2012, o Estado também tem a capital com maior número de suicídios (9,5) no país. Os dados apontam um crescimento de 75,8% no índice de 2011 para 2012. Só na comarca de Canoinhas, que engloba também Três Barras, Bela Vista do Toldo e Major Vieira, foram nove registrados até agosto deste ano, o mesmo número de suicídios registrados durante todo o ano passado. Os dados do 3º Batalhão de Polícia Militar indicam que possivelmente teremos um recorde até o fim do ano na região.

 

COMO FREAR?

Segundo a OMS, 90% dos suicídios poderiam ter sido evitados. Aiessa explica que para ajudar pessoas deprimidas, com tendências suicidas, o primeiro passo é levá-las a sério, ouvindo-as pacientemente. O segundo passo é indicar um profissional para ajudar a pessoa. “Tem muita gente com preconceito, achando que psicólogo é coisa de louco. Muita gente tem a visão de que o psicólogo trata loucura, quando na verdade é um profissional capacitado para trabalhar com as mais diversas queixas e sintomas”, afirma. Ela reforça que apoio da família e religiosidade são fatores importantes para ajudar a pessoa (leia mais dicas ao lado). A psicóloga lembra que ninguém fala que está disposto a tirar a própria vida para chamar a atenção. “Quem diz que quem ameaça (se matar) não faz, não se engane, faz sim”, alerta.

 

Aiessa frisa que a depressão é uma das causas do suicídio, mas não única. “A maioria das pessoas que tentam ou cometem suicídio tem um problema mental. Pode ser bipolaridade ou esquizofrenia”, por exemplo.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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