Show se transformou em comício depois que fã tentou invadir palco para abraçar o ídolo
VIROU COMÍCIO
Quem foi ao Parque de Exposições Ouro Verde neste domingo, 16, para assistir o show do sertanejo Gusttavo Lima, foi surpreendido por um comício improvisado no meio do show. Depois que uma fã tentou invadir o palco para abraçá-lo, Lima interrompeu o show para fazer uma referência à violência. “Triste o que vem acontecendo, essa violência tão grande no nosso País… do que aconteceu com nosso querido futuro presidente Bolsonaro”, disse, sendo seguido de gritos de parte da plateia de “Mito, mito…”, como costumam chamá-lo os seguidores de Jair Bolsonaro (PSL), que está se recuperando de uma facada recebida há duas semanas em Juiz de Fora (MG).
A empolgação de parte da plateia estimulou Lima a seguir: “Assim, eu acho que de uma forma ou outra estamos sendo vítimas de uma sociedade sem controle, de pessoas sem controle. Pessoas de bem né, pessoas de família, quem tem filhos, quem tem família, quem prega e defende de toda a forma os valores da nossa família tradicional brasileira. Creio que de uma forma ou de outra, a gente precisa de uma solução já, agora! Não é daqui a um ano, dois anos, não. O único cara que pode mudar isso vocês sabem quem é. Ele, mais do que nunca, foi uma vítima… quando falam que ele prega não sei o que, ele é vítima do que ele tá tentando combater… Pra pensar no futuro de um Brasil melhor para todos nós”.
PRA ENTENDER
Gusttavo Lima já declarou abertamente seu voto em Bolsonaro e isso tem de ser respeitado, assim como o voto de cada um, faz parte da democracia. Agora usar um evento que tem dinheiro público empatado (dos cerca de R$ 1 milhão de custo total da festa, R$ 93 mil vêm dos cofres do Município), para onde quem não vota em Bolsonaro foi, evidentemente, para assistir a um show e não fragmentos de um comício, não dá. Aliás, é ilegal e pode trazer sérios problemas para o prefeito Beto Passos (PSD).
Parece claro que Passos, muito menos os promotores do evento, quiseram transformar o palco da Fesmate em palanque político. Mas Gusttavo Lima quis. Se houver representação na Justiça Eleitoral, o prefeito terá problemas. Pode ser acusado de promover a festa para disfarçar propaganda política partidária. Complicado.
INCÓGNITA
O que seria a família tradicional brasileira, defendida por Lima e, segundo ele, por Bolsonaro? Eis uma incógnita.
Como presidente, se eleito, Bolsonaro terá de governar para todos. É o que rege a Constituição. Se a interpretação de família tradicional é aquela composta por pai, mãe é filhos, lamento informar, mas segundo o último censo, 50,1% das famílias brasileiras são diferentes dessa formação. São pais ou mães que criam os filhos sozinhos, casais homoafetivos, casais sem filhos, etc. Esse contingente não terá presidente, ou, pior, será escravizado pelos iluminados da família tradicional brasileira, como no seriado O Conto da Aia?
As mulheres, que chegaram a criar uma página no Facebook para dizer #elenão a Bolsonaro, tem aumentado sua liderança dentro das famílias. O número de famílias chefiadas por mulheres mais que dobrou na última década e meia. De acordo com estudo elaborado pelos demógrafos Suzana Cavenaghi e José Eustáquio Diniz Alves, coordenado pela Escola Nacional de Seguros, o contingente de lares em que elas tomam as principais decisões saltou de 14,1 milhões, em 2001, para 28,9 milhões, em 2015 — avanço de 105%. Isso exclui a presença do homem dos anos 1950 (o que me remete a família tradicional brasileira), provedor e chefe de família.
Gusttavo Lima, que inclusive tratou mal fãs que o abordaram no aeroporto de Três Barras, já fez vídeos com armas nas mãos, louvando a ideia de liberar o estatuto do desarmamento, uma das bandeiras de Bolsonaro. Ótimo para ele e quem pensa como ele. Agora vir a Canoinhas e enfiar um discurso político a goela abaixo de quem não foi vê-lo para isso (inclusive pagaram ingresso para ouvir o rouxinol cantar e não fazer pregação política), ele não pode. Aliás, ninguém, a pretexto de defender qualquer candidato, pode fazer.
ADEMAIS…
A 22ª Fesmate foi um sucesso. O domingo, 16, foi de corredores lotados no Parque de Exposições Ouro Verde. O risco de se promover uma festa deste porte em ano eleitoral, temido inclusive pelos organizadores, foi justamente o que aconteceu no show do sertanejo.