Eleições: Força do imaginário popular superou as narrativas do medo

O voto em Jair Bolsonaro é a favor da economia livre, da segurança pública e de valores conservadores

 

 

Walter Marcos Knaesel Birkner*

 

 

O resultado das eleições presidenciais expressa que a força do imaginário popular superou as narrativas do medo. Ao contrário da polarização ideológica verificada, aproximou o pensamento comum de classes econômicas distintas. É um voto contra a corrupção, a má gestão e o extrativismo estatal. É um voto a favor da economia livre, da segurança pública e de valores conservadores. Para defender essa pauta, o presidente eleito se comportou, até aqui, como incendiário. Daqui pra frente, para governar, terá que agir como o bombeiro.

 

 

A maior parte do eleitorado expressou seu descontentamento com a má gestão da coisa pública. A corrupção é o elemento mais visível do problema. Não obstante, as benesses também começam a aparecer. Não é que o brasileiro seja santo. É que ninguém gosta da imposição de contribuir em nome do público pra atender o interesse imoral privado. E os operadores deste Leviatã já não escondem seu objetivo antirrepublicano: o autossustento e os privilégios, ante o sacrifício de quem trabalha e sonha.

 

 

Nesse sentido, o presidente eleito expressou o anseio conservador e romântico de eleitores irados com a mentira governamental. O homem das ruas, que não é filiado nem tem cargo político, quer uma vida pequeno burguesa: trabalho, propriedade, família e segurança. Outras demandas são importantes, mas ficam pra depois. Afinal, são 13 milhões de desempregos e 63 mil homicídios. Isso aproxima pobres e ricos em resposta à insuficiência do Estado de direitos, formando a onda conservadora.

 

 

O próximo governo tem de religar-se à sociedade. Paradoxalmente, precisa desatilhar laços de excessiva dependência e deixar a sociedade caminhar por si. É longo prazo, mas começa agora. As últimas experiências governamentais nos permitiram perceber o quanto o País é burocraticamente travado e o quanto os fins têm sido prejudicados pelos meios. Por força dos interesses patrimonialistas que governam em nome do bem-estar, este fim foi atropelado pelo meio, qual seja, a sustentação do Estado.

 

 

Antes mesmo de assumir, será preciso cumprir a primeira promessa viável: montar uma equipe à altura da tarefa. O Brasil tem inteligência de sobra na esfera governamental e fora dela. Como reagirão os partidos ávidos por cargos e até onde podem ser contemplados é uma curiosidade a ser revelada. A corrupção e o fisiologismo não acabarão, mas terão de sair do atacado e voltar para o varejo. Enquanto isso, a equipe de governo preparará o pacote de reformas a serem apresentadas ao Congresso.

 

 

Aí está o grande desafio: o Seu Luiz da mercearia sempre diz que de boas intenções o inferno tá cheio. A reforma da previdência é necessária. O rombo será de R$ 200 bilhões este ano e sua distribuição revela injustiças que deixam a pressão arterial do Seu Luiz lá em cima. Não podemos deixar essa “herança” aos nossos filhos e netos. Isso inclui os R$ 6 bilhões anuais de pensões às 87 mil filhas de militares, segundo o blog do jornalista Lucio Vaz, da Gazeta do Povo, em 17/04/2018. O que o batalhão do Capitão proporá a respeito?

 

 

Há outras e boas intenções em curso. Elas precisam ser devidamente negociadas com o Congresso, cujo apoio pode ser tão volátil quanto o do eleitor insatisfeito no sétimo mês de qualquer governo travado pela incapacidade de negociar. Mas isso não é rogar praga. Só manifesta inquietações normais ante um presidente eleito cuja candidatura ofereceu uma catarse ao eleitor, mas não apresentou um plano de governo. A maior parte do eleitorado assinou um cheque em branco a quem confiou pelas boas intenções.

 

 

Bem no fim, o bom andamento da economia será o apaziguador dos ânimos. Dependerá das condições de destravá-la, tarefa política do próximo governo, em alinhamento com um Congresso que, a princípio, parece favorável. Sua comunicação com o povo terá de ser franca e explicativa, mantendo o eleitor de olho no legislativo. Além disso, terá de se dispor a apagar as chamas da intolerância. Aí uma grande incógnita. Será o desafio e a responsabilidade que o cargo lhe cobra, de transitar da condição de incendiário a bombeiro.

 

 

*Walter Marcos Knaesel Birkner é sociólogo

** A PARTIR DESTA SEGUNDA A COLUNA ‘PROBLEMAS DO BRASIL’ PASSA A SE CHAMAR ‘O BRASIL COMO ELE É’

 

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