(Porque ainda é Tempo Pascal)
Quase não haviam dormido. Fora tenebrosa a noite carregada das lembranças daqueles maravilhosos tempos que agora não mais se repetiriam. Maravilhosos dias e maravilhosas noites em que muito ouviram e muito viram e muito aprenderam.
Reuniram-se na manhã de domingo no mesmo local onde estiveram naquele dia consagrado e as últimas palavras d’Ele ainda ecoavam nos ouvidos e na alma dos dez amigos que ficaram.
Eram então apenas dez naquela manhã de Domingo Pascal. Um dos que lá não estava era o eterno viajante que quando chegava para as reuniões já chegava cansado e atrasado porque para os longes tinha ido. E o outro, o outro violentamente se fora para outro mundo, um mundo além dos escuros infinitos, embarcado em sua nave de remorsos construída e envolto em forte corda atada em grosso galho de uma velha árvore pendente no precipício onde em princípio quisera se atirar.
Devagar os dez amigos foram chegando naquela manhã de domingo de Páscoa, meio amedrontados, envoltos em seus mantos que escondiam suas faces e cobriam suas cabeças, temerosos, imaginando que seus passos estivessem sendo seguidos.
Sentaram-se nos bancos encostados às paredes, longe da grande mesa. Macambúzios, tristes, cabeças baixas, pouco falavam e quando falavam era um balbucio, um sussurro apenas.
E confabulavam entre eles, como se segredos contassem, temerosos e angustiados. Se o Mestre, diziam, se o Mestre que há mais de mil dias eles seguiram, se o Mestre que só o bem havia feito, se o Mestre que só do Amor entre todos os Homens falava, se aquele Mestre havia sido perseguido, havia sido preso, havia sido torturado e sentira a vida ir se esvaindo aos poucos sob sofrimento intenso, se tudo isto fizeram ao Mestre o que a eles, seus seguidores estaria sendo reservado?
Porque, em momento algum, em nenhum lugar do mundo, em todas as épocas seguidores de uma nova filosofia tiveram uma diferente morte e um diferente fim daquele a quem seguiam.
E trocavam palavras imaginando como iriam levar aos demais povos do mundo os ensinamentos do Mestre se não conseguiam repetir mais que pequenos arremedos de todo o manancial de conhecimentos que lhes fora transmitido…
Como iriam eles cumprir a missão que o Mestre lhes havia incumbido, a missão de levar as palavras d’Ele para os povos que falavam outras línguas? “Logo nós- murmuravam – logo nós, que tão ignorantes somos?”
Sim, porque Ele escolhera homens simples, homens do povo, trabalhadores, artesãos, pescadores para disseminar a sua palavra pelo orbe todo. Não sábios, nem doutos, nem estudados homens. Mas homens nos quais Ele percebeu o dom que a disseminação de sua doutrina precisava.
E ali, sentados, cabisbaixos, tímidos foram fazendo as orações que o Mestre lhes ensinara. Em círculo, em toscos bancos, uniram-se em prece, concentrados, em profunda meditação e assim ficaram por infindáveis momentos.
Perceberam que imensa paz deles se apoderava. E mais perceberam então…
No lusco-fusco da manhã eis que um fulgor diferente começa a clarear toda a sala.
Um clarão cada vez mais intenso foi tomando conta do ambiente. E eles todos, assustados, primeiramente apenas fecharam os olhos e depois cobriram o rosto com suas mãos, tal a intensidade da luz que quase os cegava.
E, subitamente, do meio daquela névoa de dourada luz emana uma voz deles tão conhecida pedindo que nada temessem, que abrissem os olhos, que do rosto as mãos tirassem.
E, no meio daquela névoa de dourada luz eles O viram. No meio daquela névoa de dourada luz estava Ele com sua branca túnica e seu vermelho manto. E viram os raios que de seu peito surgiam, como se de ouro fosse o seu coração.
E ali estava Ele, o seu Mestre, o seu amigo, materializado a frente deles.
Então Ele lhes disse que foram as preces que eles haviam feito, concentrados, em profunda meditação, que permitiu que aquele ambiente se tornasse mais diáfano, mais leve e Ele pode então chegar e no meio deles permanecer.
Continuando, prometeu a todos que por mais um pouco de tempo entre eles permaneceria. E que logo depois, algum tempo depois, Ele ascenderia para os espaços mais altos, para esferas mais superiores e então logo eles poderiam levar a sua doutrina, o seu evangelho, a boa nova que havia lhes ensinado, para todos os povos da terra.
Pediu que continuassem com as preces que haviam aprendido e que sempre, em profunda meditação, concentrassem o seu pensamento nas mais belas imagens proporcionadas pela natureza, pois assim conseguiriam explanar as palavras do Pai a todos o Homens de Boa Vontade em todos os cantos da terra.
Que tudo aquilo que Ele lhes falara e mostrara e falara e mostrara aos milhões que diuturnamente O seguiram naqueles mais de mil dias de sua pública peregrinação pela terra chegaria sempre fácil ao pensamento deles e pelas suas bocas escorreria para deslumbrar as multidões que a espera deles estariam para ouvi-los.
E lhes prometeu que se assim o fizessem todos os sábios e doutores do espaço unidos a eles estariam em todos os tempos e em todos os lugares da terra quando eles estivessem pregando as divinas palavras de Amor e de Paz.