Andanças pela América do Sul (V)

Aventura pelo Peru termina em Lima e vai a La Paz, na Bolívia

 

 

Das planuras da costa do Pacífico voávamos em direção aos altiplanos andinos. A distância a ser percorrida, no espaço aéreo, não era longa, mas, curto, sim, o tempo para que eu me deslumbrasse com a visão desde as alturas. Pasma é a palavra. Pasma, sim eu fiquei, de olhos grudados no vidro ovalado, observando as montanhas que desfilavam lá embaixo.

 

 

Desenhavam-se no solo profundas escarpas e angustos vales e, no seu fundo mais fundo, corria um fino fio de cristalina água brilhando ao sol de primavera. E os cumes, no alto mais alto, com suas alvas coroas despontavam. O eterno branco das neves que se pensava jamais derreter.

 

 

Era manhã ainda. O sol incidia seus raios sobre todo aquele diversificado e colorido lençol debruçado sobre os Andes. A tonalidade das rochas mudava de instante a instante. Imensos arcos-íris alternavam-se pelos caminhos…

 

Lago Titicaca

E, eis que, num repente, ele surge ante os meus olhos. Ele, imenso, azul, translúcido, com suas vagas levadas pelos ventos, batendo-se em milhares de praias. Ele, o majestoso lago de tantas histórias narradas ao pé das fogueiras ancestrais. Ele, o lago dos Incas. O berço dos Incas. Ele, o Titicaca. Do alto, a impressão de ser apenas uma lagoa. Mas,uma lagoa que de dentro da aeronave demorou a se perder de vista…

 

 

Nem bem a sua imagem ficava ao longe, já pousávamos no aeroporto de La Paz. Melhor dizendo, no aeroporto de El Alto, o mais alto, de nível internacional, no mundo.

 

 

Uma sensação diferente pousar numa altitude de mais de quatro mil metros.

 

 

Ao descermos da aeronave outro espetáculo à nossa frente. Foi um suspirar tão forte que até os anjos ouviram meus haustos. Apenas sussurrei, na mais sublime reverência, uma palavra. Illimani! Imponente, lá ao longe, apontando para os infinitos azuis dos céus, com a suprema majestade, os quatro picos mais lindos do mundo, totalmente recobertos pela brancura das neves eternas.

 

 

Fui aspirada de meu enlevo, quase sobrenatural, quando ouvi chamarem por meu nome. Era hora de retornar ao mundo. E enfrentar as obrigações aduaneiras da entrada em um novo país.

 

 

Ao deixamos o salão de desembarque logo encontramos o pessoal que recepcionava os congressistas com um saudoso “Bienvenido a Bolívia!” Deixamos o saguão do aeroporto e o ar rarefeito da altitude em que agora nos encontrávamos já começava a delinear os seus efeitos em nosso organismo. Poucos minutos depois de entramos no carro que nos levaria ao hotel, a fantástica cidade de La Paz, no seu todo, mostra-se para nós.

 

Aeroporto de La Paz

 

A primeira impressão que eu tive é de que ela estaria situada dentro de uma imensa cratera de um vulcão extinto, ou de uma enorme depressão que os deuses pré-incaicos lá haviam moldado como morada para os seus eleitos. Descemos, desde o aeroporto, quase uns quatrocentos metros. O que naquelas alturas pouco ou quase nada significa.

 

 

Nossos sorridentes recepcionistas levaram-nos para o hotel que havíamos reservado. Em poucos minutos lá estávamos. Enquanto preenchíamos nossas fichas, os colegas bolivianos alertavam-nos para deixarmos nossas bagagens aos cuidados do pessoal do hotel, que andássemos mais devagar, cuidando, principalmente, com as subidas pelas ladeiras. Éramos calouros nas áreas de elevadas altitudes.

 

 

Logo que nos acomodamos em nossos aposentos era chegada a hora do almoço. Que ocorreu no próprio hotel, a fim de evitarmos correrias pelas ruas em busca de algum restaurante. Lembro-me bem daquela sala de refeições. Imensa. Toda envidraçada. Com aconchegante terraço ao lado. De onde se avistava La Paz debruçada sobre o vale. Uma praça com muitas árvores, em frente. Ao fundo, uma igreja que deveria remontar ao tempo da colonização espanhola.

 

 

Enquanto me embevecia com estas magníficas imagens serviram-nos o almoço. Foi um dos pratos mais saboroso que comi em minha vida. Peixe fresco, captado naquela manhã nas gélidas águas do Titicaca.

 

 

Após almoçarmos fomos fazer o tradicional reconhecimento do espaço onde estava sendo instalado o X Congresso Latino Americano de Anestesiologia. Era um dos mais tradicionais locais de eventos de La Paz. No balcão destinado às inscrições pegamos o nosso material. Com detalhes, toda a programação científica. Nela, em destaque, a palestra da noite de abertura. Que seria proferida por um convidado muito especial, o Professor Dr. Danilo Freire Duarte. Constavam da pasta, ainda, alguns regalos da Bolívia. E logo fui ver a programação social. Onde, anexado já se encontrava um convite para um jantar naquela noite.

 

 

Danilo ficou no recinto do Congresso, pois logo teria início importante reunião de uma das comissões da CLASA, da qual era ele o presidente. Laura e eu fomos fazer nosso primeiro reconhecimento pela tarde de La Paz.

 

Igreja de São Francisco

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Saímos a vagar, lentamente, é claro, pelas ruas, olhando a tudo com a maior curiosidade. A intenção principal era a de conhecermos a Igreja de São Francisco. Que é o principal monumento do período colonial.

 

 

O portal dela é uma obra de arte única. Esculpido em pedra. Seu estilo arquitetônico é o chamado barroco mestiço. Consta ser um estio decorativo híbrido feito por mãos indígenas ainda na época da colonização espanhola.

 

 

Na tarde silenciosa ficamos admirando o seu interior. Que lembrava mesmo o do grande pastor que pregava aos passarinhos. E agradecemos a ele por podermos estar ali, naquele lugar tão místico.

 

 

À noite nossos anfitriões foram nos buscar no hotel. Alguns anestesistas bolivianos eu conhecera em congressos nossos, brasileiros. Foi na casa de um deles que terminamos aquele nosso primeiro dia em solo boliviano, um dia que fora de intensas correrias, um dia de mudanças drásticas de altitude. No decorrer do jantar falei para os amigos bolivianos que estava me sentindo muito bem, sem o sono que deveria tomar conta de mim, uma vez que, na noite anterior, ainda em Lima, eu pouco dormira. Dei créditos à altitude local por estar assim tão disposta. Foi, então, que a esposa de um anestesista de La Paz, que estivera participando de um congresso nosso em Guarapari, encontrou a explicação para o sono intenso que naquela praia a dominara, em todos os dias em que lá permanecera.

 

 

 

É! A altitude foi minha amiga. Pude desfrutar de muito mais horas acordada, sem a preocupação de depois começar a cochilar nas escurecidas salas no decorrer das palestras e mesas redondas.

Rolar para cima