Segundo três médicos e a filha de um paciente, empresa teria agido de má fé ao pagar procedimentos e aluguel com cheque sem fundo
A empresa de agenciamento de consultas e exames médicos Tischler Saúde, de Canoinhas, está sendo acusada de aplicar golpes contra uma família e três médicos da cidade. Francine Portela registrou boletim de ocorrência na Delegacia de Canoinhas denunciando que pagou R$ 7 mil para que a empresa contratasse uma cirurgia de próstata para seu pai, Basílio Portela Martins. O procedimento aconteceu em 28 de setembro.
A empresa recebeu os R$ 7 mil em dinheiro com a promessa de repassar o valor para um médico que confirmou as informações, mas não quis que a reportagem o identificasse.
Segundo o médico, ele recebeu um cheque no valor da cirurgia de Letícia Almeida, funcionária da Tischler que seria a responsável por agenciar os serviços médicos. Ao depositá-lo, o cheque voltou por estar sem fundos. O médico reapresentou o cheque outras vezes, mas sem sucesso.
O valor de R$ 7 mil incluía o custo da cirurgia e hospedagem no Hospital Santa Cruz. Para liberar o pai depois da alta médica, Francine fez um acordo com o setor financeiro do Hospital para pagar posteriormente apenas o custo do material utilizado na cirurgia e recuperação. O Hospital confirma a informação, afirmando ainda, que a Tischler Saúde nunca foi parceira da instituição.
O médico procurou uma advogada, que entrou em contato com a empresa. A Tischler afirmou que o dinheiro entraria na conta dali a dois dias, o que até agora não aconteceu. “Eles não negam que vão pagar, mas ficam enrolando há mais de um mês”, afirma o médico lesado.
Ele afirma que nunca teve acordo com a Tischler e que consultou Basílio como um paciente particular. Marcou a cirurgia esperando acertar o custo com a família. “Quando descobri que eles já tinham pagado o valor para a Tischler, disse que eles não deveriam ter feito isso”, explica.
Na semana passada, um advogado telefonou para o médico afirmando representar a Tischler e propondo um acordo de parcelamento em seis vezes. O médico não aceitou. Ele também registrou boletim de ocorrência contra a empresa.
PELO FACEBOOK
Em uma página restrita a médicos, o Dr. Augusto César Souza, de Curitiba, também denunciou a Tischler e um consultório médico de Canoinhas. Ele postou a imagem de um cheque sustado pela Tischler que teria sido pago a ele por serviços prestados em Canoinhas. “Me fizeram desmarcar dias certos de atendimentos que eu tinha com promessas de salários estratosféricos. Caí no golpe como um principiante, mas quero deixar aqui meu alerta para que mais colegas não sejam ludibriados”, escreveu.
O JMais entrou em contato com o responsável pelo consultório médico denunciado pelo Dr Augusto, que afirmou que alugou uma sala para a Tischler dentro de seu consultório. Ele se diz vítima de calote por parte da empresa que também teria pagado o aluguel com cheque sem fundo. “Fui duas vezes vítima. Além de não receber (pelo aluguel) o médico (Dr. Augusto) ainda me caluniou”, reclama. Ele entrou em contato com Dr. Augusto, explicou a situação e o colega retirou a postagem do Facebook. O consultório de Canoinhas também registrou boletim de ocorrência contra a Tischler.
OUTRO LADO
Há uma semana o JMais tenta ouvir a Tischler Saúde. Em contato com Leticia Almeida, apontada pelos ouvidos na reportagem como responsável pela empresa, ela não quis dar entrevista, afirmando que o responsável é o farmacêutico Francisco Tischler Filho. Ela não repassou o contato de Filho. O JMais entrou em contato com a advogada da empresa, que disse que daria retorno até o final desta quarta-feira, dia 1º, o que não aconteceu.
MEDICINA POPULAR
Diante do aumento do desemprego, que empurrou milhares de usuários para fora dos convênios, e da sobrecarga do Sistema Único de Saúde (SUS), pacientes têm recorrido cada vez mais a serviços como os oferecidos pela Tischler. A ideia é que essas empresas agenciem consultas e exames operando como intermediárias entre pacientes e médicos com um custo mais baixo. O médico ganha em quantidade e a empresa ganha em comissão. Uma consulta médica que hoje custa R$ 250, de fato, pode sair por até R$ 150 de um horário que, antes, seria ocioso para o médico ou laboratório.
Esses preços representam a oportunidade de acesso à saúde para uma parcela da população acostumada a percorrer uma via-sacra em busca de atendimento.
Reportagem sobre o assunto publicada pelo jornal Diário Catarinense ouviu a gerente administrativa de uma dessas empresas em Florianópolis. Ela explicou que a margem de lucro “é muito baixa e trabalha com volume grande”. Aí que reside uma das principais críticas às clínicas populares. Apesar de serem vistas como uma alternativa para a população, entidades médicas do Estado enxergam o modelo com preocupação, já que para dar lucro é necessário ter um fluxo grande de pacientes. Na prática, isso pode levar à queda na qualidade com consultas vapt-vupt.
Empresa ganhou duas licitações em São Mateus do Sul
Na semana passada, a Tischler ganhou dois processos licitatórios para prestar serviços para a Prefeitura de São Mateus do Sul usando duas razões sociais diferentes: Francisco Tischler Filho e Lindacir Terezinha Soares com nome fantasia de Tischler Medicina, Diagnóstico e Capacitação e Tischler Centro Médico e Diagnóstico respectivamente. Apesar dos nomes diferentes, a empresa tem o mesmo telefone e email.
Ainda nesta semana a prefeitura de São Mateus do Sul anulou um dos processos.
“De acordo com o departamento de licitações do município, as empresas Tischler Medicina, Diagnóstico e Capacitação, primeira colocada e a segunda, Tischler Centro Médico e Diagnóstico, foram comunicadas do parecer do certame e terão um prazo de três dias para recurso”, disse o Município em nota. O prazo vence na segunda-feira, 6.