ESPECIAL | Setenta dias depois de assassinato em Três Barras, suspeitos podem ser soltos

Mirian quando grávida da filha que fez dois anos um dia antes de sua morte/Arquivo da família
Mirian quando grávida da filha que fez dois anos um dia antes de sua morte/Arquivo da família
Foto: Pais de Mirian com a foto da filha grávida/Edinei Wassoaski/JMais

 

A tarde de 12 de novembro de 2014 foi apagada da memória de uma menina de dois anos, moradora do bairro Argentina, em Três Barras. Ao chegar da escola na casa onde vivia com os pais na rua Francisco Jenzura, correu para abraçar a mãe, a cabeleireira Mirian Ricardo de Jesus Dufeck, 27 anos, que estaria no quarto do casal. Ao abrir a porta, voltou para trás. O espanto no rosto da menina fez o pai, Carlos Welington Dufeck, que tinha ido buscá-la na escola, correr ao encontro da filha, em estado de choque. Ao empurrar a porta do quarto, percebeu que havia algo a emperrando. Espiou para dentro e se desesperou ao ver o rosto de sua esposa misturado a poça de sangue que esvaia de seu pescoço. Estrangulada, com os olhos abertos e a língua para fora, a mulher já estava gelada. Eram 17h15 quando Carlos saiu correndo para a rua, desesperado, pedindo socorro à vizinha da frente. Mal sabia ele, e a própria vizinha, que o filho da primeira pessoa que ele pensou em pedir socorro, seria acusado do assassinato um mês depois.

A vizinha correu em seu socorro. Amiga de Mirian, não conteve o desespero ao vê-la em tal estado. Mesmo assim, encontrou forças para chamar a Polícia que, em poucos instantes isolou o local. Policiais civis e o técnico do Instituto Geral de Perícias (IGP), Marcelo Severino Melo, chegaram em seguida. Vizinhos, curiosos e familiares foram chegando aos poucos, chocados com a ousadia de quem matou a cabeleireira.

Em uma rua movimentada, onde todos se conhecem, o autor (ou autores) conseguiu entrar na casa sem ser visto e, ao ser flagrado por Mirian, entrou em luta corporal com a cabeleireira (há sinais de luta por toda a casa), amarrou-a, estrangulou-a, cortou seu pescoço e roubou R$ 110 de sua bolsa. Assim como chegou no local, saiu sem ser visto por ninguém.

No velório de Mirian, mais de 600 pessoas se comoveram com sua filha: “Mamãe, levanta daí e vai mimi na cama, vai”, dizia ela para o esquife da cabeleireira.

Hoje, a menina parece ter bloqueado a lembrança da mãe morta. Prefere pensar que ela dormiu um sono eterno. “A mãe dormiu e foi pro céu”, responde quando questionada.

 

ACUSADOS PRESOS

Um mês depois da morte de Mirian, o delegado regional Wagner Meirelles apresentou quem seriam os principais suspeitos: dois maiores de idade e dois menores (um deles tem 18 anos, mas ao supostamente cometer o crime era menor).

Segundo Meirelles, a hipótese mais provável é de que os quatro teriam esperado a cabeleireira sair de casa para furtar. Durante o furto, no entanto, foram surpreendidos por Mirian, que retornou para casa. Como ela conheceria um dos acusados (justamente o filho da vizinha da frente), eles teriam decidido assassiná-la.

Com os suspeitos foram recolhidos telefones celulares, computadores, CDs e DVDs.

Todo o material colhido foi encaminhado para a perícia. Tanto a análise no local do crime, quanto a análise dos eletrônicos apreendidos não apontou indícios que incriminem nenhum dos quatro. O resultado da perícia saiu nesta semana. A Polícia tinha esperança de que um vídeo gravado no local do crime que, supostamente, está circulando em telefones celulares por meio do whats app, estivesse gravado nos aparelhos apreendidos. Nada foi encontrado. Das três impressões digitais coletadas no local do crime, apenas uma não estava prejudicada e pode ser comparada a dos quatro suspeitos. Não houve compatibilidade.

A esperança de Meirelles, agora, é de que o exame de DNA feito em uma bituca de cigarro encontrada no local do crime aponte compatibilidade com um dos quatro suspeitos. Nenhum dos moradores da casa fuma.

 

Perícia só liberou laudos depois de determinação judicial

O Instituto Geral de Perícias (IGP) só liberou os laudos feitos a partir do material coletado no local do crime e nas casas dos suspeitos, depois que a juíza criminal Gisele Ribeiro notificou o perito sobre os riscos nos quais incorria no caso de não liberá-los em três dias.

Os laudos têm mais de 50 páginas, mas nenhuma resposta que oriente a Polícia. O diretor do IGP de Canoinhas, Marco Antonio Bubniak, diz que o trabalho é, de fato, demorado. “Além de ser um trabalho minucioso, às vezes aparece um furto e a gente tem de largar para atender esse outro caso”, explica. Sobre o pouco número de impressões digitais coletadas no local do crime, Bubniak diz que havia muitas impressões escorregadias, ou seja, inúteis para o exame papiloscópico.

Sobre o exame de DNA, ele se comprometeu em ir a Joinville nesta semana para pedir agilidade por parte do IGP na análise. “Para nós esse crime é prioridade, mas para o Estado é só mais um”, afirma.

Apesar de reclamar da falta de peritos (apenas dois atendem toda a regional de Canoinhas), Bubniak diz que o Instituto funciona muito melhor do que quando subordinado a Polícia Civil. O IGP ganhou autonomia durante o primeiro mandato do governador Raimundo Colombo.

 

Pais pedem por justiça

OUÇA A ENTREVISTA:

Da varanda de sua casa, Valdevino Ricardo de Jesus e Maria Zelinda de Jesus, pais de Mirian, olham para a vizinha, irmã de um dos acusados do crime. “Ela veio aqui e nos disse que se ele for culpado, que pague, mas que se for inocente, que seja solto. Concordo com ela”, diz Valdevino.

A morte de Mirian mexeu com Três Barras. “A vizinha aqui do lado vive com as janelas trancadas, tem medo que aconteça com ela o que aconteceu com a Mirian”, conta Maria Zelinda.

Para o casal, seja quem for o ou os assassinos, o que eles mais desejam é que essas pessoas estejam atrás das grades. “Não vai trazer a Mirian de volta, mas vai acalmar nossos corações”, diz Valdevino, que estava viajando quando a filha foi morta. Quando chegou, o corpo já estava sendo velado. Lembra que a filha era muito trabalhadora. Costurava, fazia almofadas, limpava o escritório do sogro e, além de manter o salão, trabalhava com grupo de jovens na Igreja Assembleia de Deus. Sonhava em ampliar o salão e abrir uma loja de móveis usados.

No dia em que foi morta, estava indo comprar ingredientes para fazer biscoitos que seriam levados à igreja. Voltou, imagina a Polícia, porque esqueceu algo. Foi quando foi assassinada.

Valdevino acredita que exista um vídeo feito pelo assassino. Sua esperança é tão grande que oferece R$ 500 de recompensa para quem der pistas da suposta filmagem. “Hoje, se você matar uma caça, você já pega cadeia, agora minha filha é assassinada desse jeito e ninguém vai ser punido. Será que minha filha vale menos que uma paca, um tatu?”

 

 

Advogados já pediram revogação da prisão temporária

Os advogados de defesa dos dois maiores de idade que estão presos já pediram revogação da prisão temporária de ambos. Baseiam-se no resultado dos laudos e na impossibilidade de eles atrapalharem as investigações.

Mesmo que a justiça negue a liberdade, eles devem ser soltos no dia 9 de fevereiro, quando se esgota a prisão temporária. Somente um elemento novo que os incrimine, os mantêm na cadeia.

 

PERGUNTAS SEM RESPOSTA

  • Ninguém viu o assassino (ou assassinos) entrando, nem saindo da casa?
  • Por que as tantas impressões digitais encontradas no local estavam danificadas?
  • Existe, de fato, um vídeo feito pelo assassino?
  • Quem fumou o cigarro cuja bituca foi encontrada no local do crime?
  • Se trata-se de latrocínio (matar para roubar), porque o assassino escolheu uma casa modesta?
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