Hospital entrega membro amputado para família de Canoinhas sepultar

Mulher ficou em choque ao receber recipiente de isopor com a mão do marido

 

 

Katia* ficou duas vezes chocada no dia 8 de dezembro. Primeiro ao saber que o marido tinha se ferido em um acidente. Ela e o marido estavam em uma confraternização da empresa em que ele trabalha em uma fazenda no interior de Irineópolis quando ele sofreu um acidente de carro. Com uma das mãos gravemente ferida, ele foi levado rapidamente para o Hospital Bom Jesus, de Irineópolis. De lá foi transferido para o Hospital São Braz, de Porto União, mas como não tinha cirurgião naquele momento no hospital, o rapaz foi transferido para o Hospital Regional São Camilo, de União da Vitória. “Disseram que ele corria risco de vida e que seria arriscado trazê-lo para Canoinhas naquele momento”, conta Katia. O casal mora em Canoinhas.

 

 

O acidente por foi volta das 15h. Depois de passar por dois hospitais, o ferido foi operado no São Camilo à noite. “Foi só momentos antes da cirurgia que o médico me avisou que precisaria amputar. Depois da cirurgia, por volta das 23h, o médico disse que eu poderia vê-lo. Quando eu me dirigia para o quarto, mesmo chorando e muito nervosa, uma enfermeira me chamou e colocou um papel na minha frente, dizendo que eu tinha que assinar, e me deu uma caixa de isopor contendo a mão dele. Disse que eu tinha que levar ao cemitério e sepultar. Questionei o porquê disso, dizendo que não queria, e ela falou que a responsabilidade era da família (eu era a única familiar lá no momento). Falei que morávamos em Canoinhas, perguntei se eles poderiam dar fim ao membro amputado, ela me disse que o hospital não faz isso. Como ela me convenceu que eu era obrigada a ter essa responsabilidade e que não tinha outro jeito, assinei o papel”, relata Katia.

 

 

Chocada pela segunda vez, Katia trouxe a caixa com a mão para casa, sem saber o que fazer. “Eu estava ficando sem saída, já que no cemitério de Canoinhas me disseram que eu teria de comprar um lote inteiro só para a mão, ou então enterrar em algum cemitério onde já houvesse algum familiar sepultado”, conta Katia.

 

 

 

Foi quando ela conversou com um amigo da família, que conversou com funcionários do Hospital Santa Cruz de Canoinhas (HSCC) e eles resolveram o problema. O HSCC fez o descarte.

 

 

“Depois de tudo isso, o hospital de União da Vitória ainda nos fez viajar até lá pra que meu marido assinasse um requerimento para que eles nos enviassem o prontuário dele, pagamos uma taxa pelo requerimento e ainda pagaremos pelo Sedex a cobrar pra quando o documento vier”, acrescenta Katia.

 

 

COMO DEVERIA TER SIDO

A mão entregue ao Hospital Santa Cruz foi incinerada, seguindo um protocolo regulado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Antes, porém, cabe ao Hospital perguntar aos parentes da vítima se eles desejam ficar com o membro amputado. Com a recusa do familiar mais próximo, ele deve assinar um documento delegando ao hospital a responsabilidade pelo descarte do membro. Esse procedimento foi confirmado por enfermeiros do HSCC.

 

 

CONTRAPONTO

Por dois dias o JMais tentou contato com o administrador do Hospital Regional, Édio Rosset. Nas três primeiras tentativas ele estava tomando café e em reuniões. Na quarta tentativa a reportagem foi informada que ele teria entrado de férias.

 

 

Uma fonte ligada ao Hospital que não quis se identificar confirmou o procedimento e disse que esse é o protocolo seguido pelo hospital. “A rotina é entregar (o membro amputado) para a família quando este ultrapassar as 400 gramas. Pesando menos, o Hospital faz o descarte.”

 

Ainda de acordo com a fonte, a família é orientada a levar o membro a um cemitério, que o enterra. Ela disse desconhecer a regra da Anvisa sobre o descarte e afirma que o Hospital não tem incinerador.

 

 

 

O QUE DIZ A NORMA DA ANVISA

Os membros amputados não contaminados ou sem suspeita da presença de agentes biológicos classe de risco IV são classificados no grupo A3, caso contrário, são classificados no grupo A1.

 

Caso sejam classificados no grupo A3, desde que não tenham valor científico ou legal e não tenha havido requisição pelo paciente ou seus familiares, após registro no local da geração, devem ser encaminhados para sepultamento em cemitério (após autorização do órgão competente municipal) ou para tratamento térmico (incineração ou cremação).

 

*a pedido da entrevistada, o nome é fictício

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