Entre idas e vindas houve exumação do cadáver, viúva suspeita e laudo atestando assassinato
A Justiça Criminal da Comarca de Canoinhas mandou arquivar, por insuficiência de provas, um dos inquéritos mais rumorosos que já aportaram no Fórum da Comarca. O inquérito apurava a suspeita de que Alcindo de Jesus Reichardt, 70 anos, teria sido assassinado em 15 de agosto de 2013, na localidade da Gralha, interior de Bela Vista do Toldo. Inicialmente havia constado em laudo pericial que Alcindo havia se suicidado. As dúvidas do filhos do primeiro casamento de Alcindo levaram a reabertura do inquérito. Em 2015 um segundo laudo indireto apontou que Alcindo não poderia ter se suicidado considerando que não havia pólvora na mão direita dele. A posição da arma também não condizia com suicídio.
O corpo de Alcindo foi exumado a mando da Justiça. Laudo pericial apontou que o projétil extraído do crânio da vítima de calibre .32 não poderia ter saído da arma encontrada sobre o peito de Alcindo, que era de calibre .38, o que reforçou a tese de homicídio.
Pouco depois a tese caiu por terra quando o delegado responsável pela investigação detectou falhas da perícia. Os policiais civis desmontaram um projétil de arma de fogo calibre .38 idêntico aos apreendidos por ocasião da morte de Alcindo. Com a utilização de um paquímetro eles descobriram que havia erro quanto às medidas verificadas pelo perito do Instituto Geral de Perícias (IGP) de Canoinhas, pois, “não levou em consideração que os cartuchos de arma de fogo apreendidos eram encamisados (jaqueta de cobre entre o cartucho e o núcleo de chumbo) e que não foram considerados para medição”, explica a Promotoria no despacho.
Nova perícia foi solicitada ao IGP de Joinville, que concluiu que o projétil de arma de fogo retirado do corpo de Alcindo se trata de um núcleo de chumbo proveniente de projétil calibre nominal .38 SPL, compatível com o calibre do revólver encaminhado à perícia. Ainda, concluiu que a arma utilizada foi a mesma encaminhada para a perícia.
AMEAÇA
Nesse ínterim Alcindo Reichardt Junior, filho da vítima, registrou boletim de ocorrência dizendo ter recebido uma mensagem de celular ameaçando-o por ter concedido entrevista ao JMais falando sobre o assunto. A mensagem dizia “pare de atentar c esse jornal pra onde foi o pai vai o filho”. Ele apontava a madrasta, Maria do Carmo, como suposta autora da mensagem.
“Maria e a vítima eram casados pelo regime de comunhão universal de bens, ou seja, ela tinha direito a metade de todo o patrimônio do casal, sendo a outra metade pertencente aos filhos. Assim, não havia sentido matar seu próprio marido para alcançar algo que já era seu por direito”, apontou o Ministério Público que sublinhou, ainda: “Por outro lado, os filhos poderiam estar se aproveitando da situação da morte do pai para tentar incriminar a madrasta, com o propósito de afastá-la da herança, inclusive chegando a registrar um boletim de ocorrência por ameaça, via aparelho com número identificado”.
A promotora de Justiça Bianca Andrighetti Coelho concluiu em relatório encaminhado à Justiça Criminal que “após analisar os autos, verifica-se que não há elementos probatórios suficientes para justificar a deflagração de ação penal, pois, em que pese as diligências investigativas realizadas pela autoridade policial, não há nos autos provas mínimas aptas a demonstrar indícios de autoria e materialidade delitiva”.
A juíza Marilene Granemann de Mello, por sua vez, acatou o relatório do Ministério Público e determinou o arquivamento dos autos do processo.
A defesa dos filhos de Alcindo não quis se pronunciar.
RELEMBRE O CASO
15/08/2013 – Dormindo em quarto separado da esposa, Alcindo Reichard amanhece morto com um tiro na cabeça e uma arma na mão direita. Maria do Carmo, sua esposa, diz não ter ouvido o disparo durante a madrugada. Peritos do Instituto Geral de Perícias (IGP) foram chamados, mas não compareceram no local. Policiais que viram a cena atestaram suicídio. Inconformados, os filhos do primeiro casamento da vítima, que uma semana antes tinham passado o dia dos pais ao lado de Alcindo insistiram em novas investigações.
18/09/2015 – O IGP começou a trabalhar com novas hipóteses e remeteu ao Ministério Público a conclusão das investigações. Para o perito Marco Antonio Bubniak, não restava dúvidas de que Reichardt não teria se matado. “O caso tem vários parâmetros, foi bastante complicado. Discuti com médicos, participei de simpósios sobre o assunto e conversei com especialistas em respingos de sangue”, explicou à época ao JMais. Bubniak disse que a posição da arma e dos braços da vítima, além da falta de vestígios de sangue nas mãos, são elementos contundentes que atestam sua tese. “Não existem manchas de retorno de sangue nas mãos da vítima”, arrematou.
30/07/2016 – Diante do impasse formado, o Ministério Público pediu a exumação do cadáver.
06/09/2016 – Reportagem do JMais, que teve acesso ao inquérito, mostrou várias falhas no processo investigatório, como a falta de perícia no corpo. O perito Fernando Voigt disse em ofício que o exame toxicológico seria impossível considerando que não houve coleta de material. Ele atestava, ainda, que não havia agulha adequada e mesa de necropsia, além de condições físicas e sanitárias, mais especificamente, falta rede de esgoto, “o que impossibilitou a coleta de sangue e urina para os exames de alcoolemia e toxicológico”, diz o perito.
11/10/2016 – Justiça autoriza exumação do corpo de Alcindo.
9/11/2016 – Corpo é exumado e a bala extraída do crânio de Alcindo.
07/12/2016 – Segundo as conclusões do perito, a bala encontrada no crânio de Alcindo não é da arma que estava na mão direita da vítima. A bala seria calibre 32. Já o revólver que estava na mão de Alcindo com um tiro deflagrado, seria de calibre 38.
25/05/2019 – Novo laudo da Polícia Civil atesta que a bala é, de fato, de calibre 38, portanto, condizente com a arma encontrada na mão direita da vítima.
3/09/2019 – Justiça reconhece a tese de suicídio como a mais plausível e manda arquivar o caso.