Bianca Furtado Melo
Correio do Contestado
A tarde desta terça-feira, 21, foi bastante movimentada no Fórum de Papanduva. Isto porque, na sala de audiências, os seis envolvidos na fraude de falsificação de documentos de médicos sem registro no Conselho Regional de Medicina (CRM) para atuar nos plantões do Hospital São Sebastião e do Pronto Atendimento Municipal de Canoinhas, começaram a ser ouvidos pelo juiz Dr. Reny Batista Neto. José Fábio Costa de Jesus, o primeiro médico flagrado trabalhando sem CRM, os médicos Rosimar Barroso Braga e Clayton Douglas Mota, também acusados de falsificar documentos, os proprietários da Med Kos, Anderson de Rezende e Karin Finatto de Rezende e o responsável em planejar a escala de plantões dos médicos, Fábio Rogério de Oliveira, foram ouvidos.
Perto de completar um ano, o esquema todo começou a ser revelado, mas ainda está longe do fim. Segundo a promotora de Justiça Julia Trevisan de Toledo, ainda falta ouvir várias testemunhas fora da Comarca de Papanduva e uma nova audiência foi marcada para o dia 3 de março de 2015.
Na semana passada, o jornal Correio do Contestado noticiou ter descoberto o suposto paradeiro do médico Fábio de Jesus através de uma denúncia, que dizia que o acusado estava em Cáceres (MT), informação confirmada pelo próprio Fábio. O jornal entrou em contato com Fábio, que retornou após alguns dias prometendo esclarecer todos os fatos. Logo após o término da audiência, ele procurou a reportagem do jornal Correio do Contestado e cedeu entrevista exclusiva a repórter Bianca Furtado Melo. Acompanhe:
Correio do Contestado: Aonde você estava atualmente?
Fábio: Eu estava em Cáceres (MT), na casa dos meus pais, como você realmente noticiou.
Correio do Contestado: E quando o esquema todo estourou, você foi logo para Cáceres ou esteve em outro lugar?
Fábio: Não, eu estava em Curitiba. Se pesquisarem meu nome vai aparecer meu endereço e meu telefone fixo de casa, porque eu morava lá. Até porque eles ainda não sabiam a minha identidade. Fiquei lá, porque tinha minhas coisas lá. Fiquei mais de um mês ainda lá e passei o réveillon em Cáceres, na casa dos meus pais.
Correio do Contestado: E você pensou em ir para o exterior?
Fábio: Não, eu não fui. Não tinha porque, eu não tinha mais o que fazer lá. A minha preocupação era que se eu estivesse pra cá, seria detido aqui, então fui para a minha cidade, ficar perto da minha família, porque se eu fosse detido lá ou tivesse algum problema, pelo menos eles agilizariam. Então, por isso que eu optei em ficar lá, não por questão de fugir. Primeiro eu fiquei um mês e pouco aqui e depois fui pra lá, porque pensei: “agora eles sabem quem eu sou e se eu tiver algum problema eu vou estar em casa.”
Correio do Contestado: Você se arrependeu?
Fábio: Sim, claro. Eu, minha família, os parentes, todo mundo sofre com isso. Por um erro meu outras pessoas sofrem. Pai, mãe, irmãos, sobrinhos.
Correio do Contestado: Como a sua família reagiu a tudo isso?
Fábio: No começo eu tentei não demonstrar nada, porque eles não sabiam o que estava acontecendo, mas aí teve uma hora que começou a cair na mídia, o povo da cidade começou a saber também, aí a história foi surgindo, um passando para o outro e não teve mais como esconder.
Correio do Contestado: Qual é a situação do seu CRM atualmente?
Fabio: A situação do meu CRM é a seguinte: Eu não tenho CRM, sou formado na Bolívia e quando eu ia dar entrada na documentação para fazer a revalidação, infelizmente deu problema. Para eu fazer essa revalidação, eu tenho que ter em média R$ 60 mil. Esses R$ 60 mil infelizmente eu não tinha e não deu tempo de entrar com essa documentação, mas daqui pra frente eu tenho que me agilizar, tentar fazer outra coisa, tentar um financiamento, tentar conseguir esse dinheiro para regularizar a minha situação perante o CRM e continuar o meu trabalho, o que eu fiz, o que eu estudei para isso. Infelizmente eu sei que o que eu fiz não foi o certo, tentando solucionar um problema, mas acabou complicando.
Correio do Contestado: Sua formação então foi na Bolívia?
Fábio: Na Bolívia, cidade de Santa Cruz de La Sierra.
Correio do Contestado: Como você chegou até a Med Koss? Ou foi a Med Koss que chegou até você?
Fábio: Não, fui eu que procurei.
Correio do Contestado: Mas você procurou sabendo do esquema deles?
Fábio: Eu procurei por conta, porque no Brasil todo, em lugar nenhum pede documentação.
Correio do Contestado: A Med Kos sabia da irregularidade?
Fábio: Não. Na verdade eu nem queria saber, só a única coisa que eu sabia era que não era só eles, é em qualquer lugar. Em Curitiba, em Cáceres, em qualquer lugar, se eu quiser hoje chegar e me apresentar como médico, ninguém pede documento. O certo seria, a gente sabe disso.
Correio do Contestado: Então a Med Kos não sabia que seu CRM era falso?
Fábio: Não, em momento nenhum e até fiquei surpreso de saber que os outros dois também não tinham o CRM. Porque até então eu não tinha contato com eles, eu tentava não ter contato porque alguém podia desconfiar de alguma coisa.
Correio do Contestado: Você conhecia os outros médicos antes?
Fábio: Não. Conheci no plantão.
Correio do Contestado: E o Eduardo Magrin de Barros, como você descobriu a identidade dele, você o conhecia?
Fábio: Sim, já. Eu fiz meu estágio aqui no Brasil, lá em Curitiba e conheci ele no Hospital.
Correio do Contestado: E ele sabia que a documentação dele estava sendo clonada?
Fábio: Não, jamais!
Correio do Contestado: E você conversou com ele depois desse caso? Teve algum contato com ele?
Fábio: Não e nem sei qual foi a reação dele.
Correio do Contestado: E qual a tua expectativa Fabio? Você acha que vai ser absolvido?
Fábio: Minha opinião é a seguinte: Eu vou responder pelo que eu fiz, mas tem coisa que não é verdade, que não é do meu conhecimento. Então claro que eu sei que eu trabalhei e não tinha CRM, e eu tenho que pagar por isso. Mas tem coisa que não cabe a mim. Não conhecia os dois, o Anderson eu conheci porque ele também fazia plantão, e na hora que eu ia receber.
Correio do Contestado: Você recebia um valor menor do que o normal?
Fábio: Até então eu não sabia. Mas aí eu comecei a ouvir outros médicos que falavam de valores e eu ficava imaginando que eu estava recebendo menos, mas eu não podia questionar. Para mim estava bom. Eu estava tentando juntar dinheiro para eu dar entrada no Revalida.
Correio do Contestado: Ouvimos vários comentários que a comunidade gostava muito de você. O que você sentia da comunidade?
Fábio: Eu tenho um enorme carinho por todos que trabalham no hospital. Aonde eu cheguei, sempre fui muito bem recebido, e pelo povo também. Eu tenho amor pelo que eu faço. O que eu fiz não faço mais. Se eu puder trabalhar, eu trabalho só na Bolívia agora. Mas eu não vou trabalhar lá porque a remuneração é baixa. Vou dar um jeito que arrumar esse dinheiro aqui, fazer um financiamento e continuar. Meu trabalho é aqui. Em relação a comunidade, todos os funcionários do hospital, por onde eu passei, foram todos muito educados e eu sempre tratei muito bem todo mundo, e isso é no meu dia a dia, meu vizinho, qualquer um.
Correio do Contestado: E você imaginava que teria toda essa repercussão, toda essa revolta por parte da comunidade?
Fábio: Eles têm direito, eu acabei mentindo, meu nome, minha identidade realmente, não tem como esconder isso, mas eu também fico indignado porque eu sempre tratei bem. E também, qual é a diferença minha para um cubano? O cubano está atendendo aí e eles não têm CRM. Então há uma divergência. O cubano pode trabalhar e o médico brasileiro não pode? O Governo podia pegar o brasileiro que estudou fora e regularizar a situação.
Correio do Contestado: Quando o caso estourou aqui, a população ficou meio em pânico, porque confundiu-se muito a falsificação do CRM com ser falso médico. As pessoas achavam que estavam sendo atendidas por falsos médicos.
Fábio: Aí dá revolta mesmo. Se eu levasse a minha mãe para ser atendida por alguém que não era médico, eu ia ficar revoltado também. Mas com o passar do tempo as coisas foram se esclarecendo um pouquinho. A mídia também tem que cuidar com o que coloca. Tem que colocar médico sem CRM, não é questão de falsos médicos. Eu falsifiquei meu nome só, não usava meu nome verdadeiro apenas, mas eu tinha conhecimento técnico, de procedimentos, tenho formação e nos depoimentos, ninguém fala mal de nós, da nossa conduta. Mas eu não tiro a razão da população, até que se prove o contrário é isso mesmo – falsos médicos. Paciência! Eu assumo as minhas responsabilidades. Eu sei que errei e agora vamos esperar pela justiça.