O País avançou e, com todo o estigma atual à política, avançamos pela democracia
Walter Marcos Knaesel Birkner*
Em meio a prognósticos e incertezas da eleição presidencial, ronda como um espectro a pergunta sobre por que o Brasil não avança? A rigor, a indagação é parcialmente injusta, mas pertinente. O País avançou e, com todo o estigma atual à política, avançamos pela democracia. Tivemos dois períodos importantes, que foram os governos de FHC e de Lula. Depois, trincou a junta do cabeçote e o motor do Chevettão fundiu. Pra retificar, o próximo governante precisa de uma agenda clara e viável, capaz de submeter o Congresso à vontade geral e religar o Estado à Sociedade.
Brasileiros estamos em geral indignados. Vivemos, de novo, aquela sensação do voo de galinha. O “agora vai” não foi e o time não subiu pra série A, trazendo de volta nosso enterrado complexo tupiniquim. A primeira década do século foi aprazível. O País cresceu economicamente e havia se tornado menos desigual, mais contemporâneo e respeitado. Parecíamos ter chegado ao topo de uma árdua, mas bem-sucedida caminhada ao desenvolvimento, com direito à entrada no “clube dos ricos”. Estávamos orgulhosos de nós mesmos.
Desde 1985, saímos de um regime militar e passamos por Sarney e Collor. Tivemos sucessivos problemas econômicos, mas preservamos as instituições democráticas. Por isso, chegamos ao Plano Real na década de 1990. Isso nos permitiu estabilizar a economia e, durante os anos 2000, geraram-se muitos empregos, renda e atendemos mais dignamente aos necessitados. Fomos da “década perdida” da hiperinflação à “década dourada” da estabilidade, do crescimento e da inclusão social. Estávamos otimistas.
Benditos os historiadores e a coruja de minerva: ensinam-nos que a distância temporal melhora a objetividade na leitura dos fatos. Ainda que PSDB e PT estejam em situação moralmente deplorável, reconheça-se: os governos de FHC e de Lula foram bem-sucedidos, respectivamente, com a estabilidade da moeda, o crescimento econômico e o desenvolvimento social. E seus êxitos foram obtidos com agendas claras à população, apresentadas ao Congresso com o respaldo popular. Além disso, demonstraram liderança e compromisso democrático. Sentimo-nos seguros.
Com apoio popular e os instrumentos de barganha do presidencialismo (cargos), esses governos negociaram com o diabo. Assim, obtiveram a governabilidade necessária para materializar a agenda de reformas, fazendo valer a máxima de que os fins, desde que republicanos, justificam os meios. Mesmo que o moralismo ideológico negue, é exatamente isso o que o eleitor quer, ou seja, resultado. A aprovação de um presidente depende de uma agenda clara e viável, cujo respaldo social submete até o mais fisiológico dos legislativos. Democracia é o império da vontade geral.
Ter uma agenda clara, viável e convencer o Congresso. Nisso resuma-se o êxito de governar. A ausência dessa condição explica porque a ex-presidente Dilma fundiu o motor do País. Sem clareza propositiva, com desprezo a princípios econômicos e indisposição ao diálogo; somados à soberba, à mentira, ao maniqueísmo e à ambição de partido hegemônico, seu governo caiu. Arrastou consigo o partido, a esquerda, a classe política, milhões de empregos e o bem-estar social. Desertificou o terreno cultivado pelo crescimento e foi substituído pela quadrilha patrimonialista que envergonha o País.
Terra arrasada e a tática inadmissibilidade do erro insuflaram o antipetismo. Somada à pusilanimidade do governo Temer, isso gerou desconfiança na democracia e nos trouxe de volta à amarga pergunta: por que o Brasil não avança? É porque governos incompetentes desperdiçam os recursos da democracia e da produção social com suas sandices corroboradas por parasitas de quem se cercam. E, ao se perderem nas trapalhadas, passam a governar para a sobrevivência. Não há mais agenda, nem diálogo, só suborno e gastança. É quando a ligação entre Estado e Sociedade se rompe.
Quando uma pessoa não reconhece seus erros, prejudica a si e aos mais próximos. Quando um governo não o faz, prejudica multidões. Passamos os últimos oito anos assim. Chega! Dilma e Temer são um distante ponto fora da curva, não a regra. Pra voltar ao curso, o próximo presidente precisa de uma agenda de reformas. Se for justa e viável, atacará privilégios, respeitará o patrimônio público e estimulará a produção – nossa galinha dos ovos de ouro. Se assim for, terá o respaldo social, submetendo o Congresso à vontade geral e restabelecendo a ligação entre o Estado e a Sociedade.
O cenário eleitoral sinaliza para o segundo turno com Haddad e Bolsonaro e as melhores ideias foram pro espaço. Paciência. Que venha o segundo turno, que é importante porque empurra os candidatos ao centro. É quando tentarão convencer os que não votaram neles. A eles, os dois candidatos terão de esclarecer a agenda, sua viabilidade e negociação com o Congresso que os eleitores acabaram de eleger. É o momento de exorcizarem os governos Dilma e Temer. Mas, sobretudo, de se mostrarem viáveis e aptos a respeitar as instituições democráticas e religar o Estado à Sociedade.
*Walter Marcos Knaesel Birkner é sociólogo