A vida que vale a pena ser vivida

Adair Dittrich reflete sobre o Setembro Amarelo                                                                         

 

O mês de setembro foi escolhido como o mês de alerta, o mês de combate ao suicídio.

 

Seria pelo colorido das flores da primavera?

 

Mas, em setembro é primavera em nosso hemisfério. Em setembro é outono no pedaço do planeta que fica ao norte do Equador.

 

Setembro, lá no lado do norte, combina mesmo com a prevenção do suicídio. Estação triste, estação da queda das folhas das árvores. Estação com um matiz que do dourado com que se cobrem as árvores vai mudando para o vermelho-alaranjado-amarelo-marrom. Até a secura total. E a queda. A nudez das árvores.

 

Para muitos, a visão desta nudez, a visão das folhas a perderem o viço, é o suficiente para transformar suas mentes. Mentes enfraquecidas que se agarram ao verde. E entendem que o vazio, os galhos vazios, à sua frente, seria um símbolo, um aviso de que a vida, para eles, findou.

 

As árvores carregadas de folhas verdes, permitem-nos usufruir de sua sombra no inclemente sol de verão. No outono, desfolhando-se, deixam passar o cálido sol da estação fria. Este sol que nos parece fazer uma tão curta curvatura, este sol de tão curta duração, que, através das árvores nuas, em nossas casas, em nossa vida, em nossa alma penetra conferindo-nos luz, calor e alegria.

 

Cada estação do ano tem a sua peculiaridade na natureza.Cada estação do ano tem a sua peculiaridade em nossa vida. E primavera e outono foram as estações escolhidas pelo Homem, para dizer ao Homem, para pedir ao Homem, que ame a vida.

 

Para que amemos viver.Para que olhemos ao nosso redor.Para que olhemos para dentro de nós. Para que possamos afirmar e até gritar que vale a pena viver.

 

Podemos, muitas vezes até pensar que a vida é dura. Que precisamos trabalhar. Que o frio é intenso. Que o calor é causticante. Que a fome dói. Mas tudo isto é passageiro.

 

A vida é uma luta contínua, dizem muitos. E luta pode ser entendida como o inconsciente a se debater contra um inimigo.E a vida não é nossa inimiga. Não se luta contra a vida. E nem pela vida.

 

Não podemos ficar parados, não podemos ficar à margem, não podemos ficar ao lado, esperando que o maná caia dos céus.

 

Algo sempre deveremos fazer para que este maná chegue à nossa casa, à nossa mesa, às nossas mãos. Algo deveremos sempre fazer para sentirmos menos frio, para sentirmos menos calor, para que não sintamos fome. Algo que possamos tirar de dentro de nós, com as nossas forças e o nosso trabalho.

 

E como é belo ultrapassar barreiras, descobrir novos pedaços de chão, novas cores e novas paisagens.

 

Pelos caminhos que percorremos, encontramos muitos amigos que apenas olham as árvores mortas, que somente olham as árvores nuas, que somente olham as flores despetaladas, pisoteadas, o céu cinzento, o breu da vida.

 

Pelos caminhos que percorremos, deparamo-nos com muitos amigos para os quais, na maior parte das vezes, não existem palavras que os livre do marasmo em que vivem Não existem palavras para tirá-los do baixo astral onde persistem em morar. Para quem a vida é triste, é sombria, é cinzenta. E é preciso ser muito amigo para se conseguir conviver com um amigo assim. Porém, são, exatamente, estes os seres infelizes que das palavras amigas, mais precisam. Que da presença amiga, mais precisam

 

O amigo, a amiga, ali, ao lado, na maior crise depressiva de sua vida quer mesmo é a solidão, o estar só, sozinho. E esta é a hora em que mais o amigo precisa do amigo. Precisa de alguém mais forte a seu lado. Quieto e mudo. Porque esta hora é a hora da dor mais doída, da dor mais dorida… do risco maior da grande tragédia chegar.

 

Buda, procurando a razão da vida, tentava encontrar a razão do sofrimento. Foi em uma de suas peregrinações pelos campos e florestas, que, em sua mente, aflorou o que nunca fora mistério. Sua filosofia de vida fala da vida, do amor à vida, da vida que vale apena ser vivida.

 

Há quem não entenda Buda e afirme que ele apregoava e pregava o sofrimento.Que Buda dizia ser necessário sofrer, para se conhecer o sofrimento. Não, Buda jamais disse que deveríamos sofrer.Buda, depois de muito pensar, de muito cismar, de fazer muita meditação, de fazer intensa revolução psíquica em seu eu interior, concluiu o que hoje nos parece óbvio, o que nos parece ser o óbvio.

 

Precisamos conhecer o sofrimento, sim, mas para não sofrermos.

 

Precisamos conhecer as causas do sofrimento, sim, para não sofrermos.

 

Precisamos conhecer o que nos causa sofrimento, sim, para não sofrermos.

 

Sabedores que somos do mal que nos causa o fumo, o tabaco, o cigarro, não façamos uso dele.

 

Sabendo de todo o sofrimento, físico e mental, causado pelo alcoolismo, fujamos dele.

 

Por que fazer uso de drogas, se sabemos das desgraças todas que elas causam a nós e aos que nos rodeiam?

 

E as consequências do sexo sem consciência? Gravidez indesejada, doenças sexualmente transmissíveis, estupros…

 

E assim também com os excessos em comida, com a preguiça, com o rancor, a avareza, a inveja, a soberba.

 

Não somos perfeitos.  Incorremos todos em muitas causas de sofrimento. Impingidas aos outros. Impingidas a nós mesmos. E, justamente, muitos dos que acreditam e pensam que, em não sendo perfeitos, não merecem viver.

 

Vivemos em um mundo de provas. E de expiações. Tudo tem seu troco, seu reverso, suas consequências.

 

Mas ninguém deve concluir que é a mais ínfima das pessoas por causa disto… e então tomar o rumo do desconhecido, de um mundo desconhecido.

 

Não precisamos acreditar em um Ser Supremo a quem a humanidade, no decorrer dos milênios, de muitos nomes já chamou.

 

Mas devemos ter a certeza de uma coisa. Que algo a tudo move. Em uníssono. Algo mantém esta engrenagem universal em funcionamento perfeito. Algo a que podemos chamar de Energia. Cósmica?

 

Eletromagnética?

 

Somos envoltos por ela. Ela faz parte de nosso ser. A mais ínfima partícula que se move no universo tem, em sua composição, esta energia. Sem ela, o nosso corpo não se moveria.Nada seria. E, quando o corpo físico fenece, por trauma ou por desgaste, esta Energia permanece.

 

Mas esta Energia não fica perdida, vagando pelas esferas de um universo sem fim.Um dia ela retornará. Um dia ela encontrará um novo corpo físico, em vias de formação, e dará a ele o impulso para viver.

 

E ela, ainda, precisa circular muito até que em fluido mais etéreo se transforme.Precisa de muita atividade no campo terrestre. Precisa.Mas ela não tem lembranças…Pelo menos, enquanto o invólucro físico está desperto… nada do que foi, aparece no lago da memória.

 

E ela precisa aprender novas coisas. Com mais dificuldade? Com mais facilidade? Depende do invólucro físico.Embora muita coisa nos pareça já conhecido de algum lugar…de alguma época esquecida nos tempos que se foram…

 

Se este ciclo de vida for interrompido, bruscamente, sem ter sido por trauma acidental, sem ter sido pelo desgaste do tempo, ela, necessariamente irá fazer parte de outro corpo físico. Retornará em outro corpo físico e recomeçara do zero outra vez.

 

Igual como um estudante que é reprovado. Precisa retornar à mesma sala de aula, repassar pelas mesmas matérias já conhecidas. Olhar os mesmos livros e apostilas, mais uma vez.A mesma paisagem.

 

Para voltar a aprender tudo outra vez?

 

Esta é a saga do suicida.

 

A energia eletromagnética do suicida retornará pelos mesmos passos.

 

Terá que passar pelas mesmas agonias, mesmos dissabores, tudo de novo.

 

Terá que refazer o mesmo tristes roteiro.

 

“Para trás, nem para pegar impulso”, como apregoa o grande filósofo Professor Clóvis de Barros Filho.

 

Filósofo, que sempre termina suas palestras, dizendo que “a vida que vale a pena só pode ser uma. A sua vida.”

 

 

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